Open-access Hipertensão Arterial Pulmonar: Intervenções para Cardioproteção

Hipertensão Arterial Pulmonar; Disfunção Ventricular Direita; Antioxidantes; Homeostase

A vasculatura pulmonar normal é constituída por um sistema de baixa pressão em comparação à vasculatura sistêmica. A hipertensão pulmonar é caracterizada por pressão média na artéria pulmonar acima de 25 mmHg. O processo fisiopatológico primário da hipertensão pulmonar é a restrição ao fluxo sanguíneo na circulação pulmonar, o que leva ao aumento da resistência vascular pulmonar e, eventualmente, à insuficiência ventricular direita. A hipertensão pulmonar pode ser idiopática (HAP) ou resultante de insuficiência cardíaca esquerda, doenças vasculares pulmonares e doença tromboembólica.1

Alterações patológicas da estrutura e função dos ventrículos caracterizam a remodelação cardíaca, que é associada a prognóstico desfavorável na HAP.2 Atualmente, não há terapia específica para o tratamento da remodelação cardíaca induzida por HAP.3

Vários mecanismos estão envolvidos na remodelação cardíaca, tais como estresse oxidativo e alterações do trânsito intracelular de cálcio.4 O estresse oxidativo é caracterizado pelo aumento de espécies reativas de oxigênio e nitrogênio.5 Importantes fontes de radicais livres são as mitocôndrias e os peroxissomos, que oxidam grupos sulfidrilas pela ação da xantina oxidase produzindo peróxido de hidrogênio e superóxido. Entre os mecanismos de defesa contra as espécies reativas, destaca-se a ação da superóxido dismutase, catalase e glutationa peroxidase que são reguladas, pelo menos parcialmente, pelo fator 2 relacionado ao fator nuclear eritróide 2. Esse fator promove a transcrição de genes relacionados à ação antioxidante.6 A contração e relaxamento do músculo cardíaco dependem de adequado trânsito intracelular de cálcio, que é modulado, principalmente, pela cálcio-ATPase do retículo sarcoplasmático (SERCA) e sua proteína regulatória fosfolambam.7

A suplementação de compostos bioativos tem sido utilizada para atenuar mecanismos envolvidos na remodelação cardíaca. O suco de uva é rico em flavonoides com propriedades antioxidantes.8 A suplementação de hormônios tireoidianos (HT) tem sido avaliada em modelos experimentais de insuficiência cardíaca, tendo disso observada redução do estresse oxidativo e melhora da função cardíaca no infarto do miocárdio experimental. O HT também modula a ativação do Nfr2 promovendo ação antioxidante.9

Considerando os possíveis efeitos do suco de uva e da suplementação de HT, foi interessante observar seus efeitos combinados em ratos com HAP induzida por monocrotalina. Em estudo publicado neste volume dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia, Proença et al.10trataram ratos com HAP com suco de uva e/ou HT via gavagem. Como esperado, os animais com HAP tiveram disfunção sistólica e diastólica do ventrículo direito. A HAP piorou os marcadores de estresse oxidativo xantina oxidase e proteína de choque térmico, a atividade da glutationa peroxidase, e a expressão da proteína SERCA no ventrículo direito. A disfunção sistólica foi atenuada com suco de uva, HT ou terapia combinada, e a disfunção diastólica melhorou somente com HT. A terapia combinada modulou favoravelmente o estresse oxidativo e as variáveis relacionadas ao trânsito intracelular de cálcio.

Os autores concluíram que o suco de uva e os HT, isoladamente ou em combinação, melhoram a função do ventrículo direito em ratos com HAP induzida por monocrotalina. Entretanto, medidas indiretas obtidas por ecocardiografia sugeriram que, usados isoladamente, o suco de uva ou HT reduziram a pressão arterial pulmonar. A redução da hipertensão pulmonar leva a melhora funcional do ventrículo direito, independentemente de alterações na contratilidade miocárdica. Uma limitação do trabalho é o fato que a manobra estressante gavagem não foi realizada em todos os grupos.

O estudo mostrou potenciais benefícios da administração de suco de uva e/ou hormônios tireoideanos na função do ventrículo direito, estresse oxidativo miocárdico e trânsito intracelular de cálcio em ratos com HAP induzida por monocrotalina. Estudos adicionais são necessários para elucidar os efeitos isolados desses compostos na hipertensão pulmonar e inotropismo do ventrículo direito.

Referências

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  • 3 Soares LL, Leite LB, Ervilha LOG, Silva BAFD, Freitas MO, Portes AMO, et al. Resistance Exercise Training Mitigates Left Ventricular Dysfunctions in Pulmonary Artery Hypertension Model. Arq Bras Cardiol. 2022;119(4):574-84. doi: 10.36660/abc.20210681.
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  • 5 Xu D, Hu YH, Gou X, Li FY, Yang XY, Li YM, et al. Oxidative Stress and Antioxidative Therapy in Pulmonary Arterial Hypertension. Molecules. 2022;27(12):3724. doi: 10.3390/molecules27123724.
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  • 10 Proença I, Turck P, Ortiz V, Campos-Carraro C, Klein AB, Castro A, et al. Função do Ventrículo Direito e Estresse Oxidativo Melhoram com a Administração de Hormônios da Tireoide e Suco de Uva em um Modelo de Hipertensão Pulmonar. Arq Bras Cardiol. 2024; 121(7):e20230602. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20230602
    » https://doi.org/10.36660/abc.20230602
  • Minieditorial referente ao artigo: Função do Ventrículo Direito e Estresse Oxidativo Melhoram com a Administração de Hormônios da Tireoide e Suco de Uva em um Modelo de Hipertensão Pulmonar

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Set 2024
  • Data do Fascículo
    Set 2024

Histórico

  • Recebido
    24 Jun 2024
  • Revisado
    07 Ago 2024
  • Aceito
    07 Ago 2024
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