Open-access Catarata congênita nas infecções intrauterinas mais comuns (STORCH): revisão de literatura

Congenital cataract in the most common intrauterine infections (STORCH): a review of the literature

RESUMO

Objetivo:  O objetivo deste estudo foi revisar os aspectos clínicos e patológicos da catarata congênita secundária às infecções por sífilis, toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus e herpes simples.

Métodos:  Trata-se de uma revisão de literatura, na qual foram incluídos artigos de periódicos indexados às bases de dados PubMed®, Cochrane, Lilacs, Embase e SciELO de 2010 a 2023.

Resultados:  Foram encontrados 45 artigos, e, após seleção, restaram 9 artigos. Além disso, foram adicionados artigos para enriquecer a discussão. A infecção por sífilis está relacionada a alterações corneanas. O citomegalovírus e a toxoplasmose estão relacionados com a coriorretinite e/ou microftalmia. A rubéola é responsável por causar catarata, glaucoma, microftalmia e retinite em sal e pimenta.

Conclusão:  Foram abordadas as principais etiologias infecciosas e seu quadro clínico na CC. O melhor tratamento para CC é cirúrgico associado a acompanhamento clínico, mas a prevenção é a maneira mais eficaz de combater a CC de etiologia infecciosa. O diagnóstico precoce e o tratamento efetivo previnem alterações e sequelas visuais irreversíveis. Nesse contexto, mostram-se importantes as ações de políticas públicas para o melhor desfecho clínico e melhor qualidade de vida.

Descritores: Catarata congênita; Sífilis; Toxoplasmose; Rubéola; Citomegalovírus; Herpes simples

ABSTRACT

Objective:  To review the clinical and pathological aspects of CC secondary to infections by syphilis, toxoplasmosis, rubella, cytomegalovirus, herpes simplex.

Methods:  This is a literature review. Articles from journals indexed to PubMed, COCHRANE, LILACS, EMBASE and SCIELO from 2010 to 2023 were included.

Results:  A total of 45 articles were found, which, after selection, remained in 9 articles. Some articles were included to enrich the discussion in this topic. The infection caused by syphilis is related to corneal changes. Cytomegalovirus and Toxoplasmosis due to chorioretinitis and/or microphthalmia. Rubella is responsible for causing cataracts, glaucoma, microphthalmia, and salt and pepper retinitis.

Conclusion:  The main infectious etiologies and their clinical status in CC were addressed. The best treatment for CC is surgery associated with clinical follow-up, but prevention is the most effective way to combat CC of infectious etiology. Early diagnosis and effective treatment prevent irreversible visual changes and sequelae. In this context, public policy actions are important for the best clinical outcome and better quality of life.

Keywords: Congenital cataract; Syphilis; Toxoplasmosis; Rubella; Cytomegalovirus; Herpes simplex

INTRODUÇÃO

O termo "catarata" denomina qualquer tipo de opacificação do cristalino, seja ela congênita ou adquirida, independentemente de causar ou não prejuízos à visão, podendo acometer um ou ambos os olhos, dependendo de sua etiologia.(1,2) A catarata congênita (CC) é a opacificação do cristalino já presente ao nascimento ou que se desenvolve no primeiro ano de vida, podendo ser determinada tanto por herança genética quanto por infecções durante a gestação.(2,3)

A CC é uma doença ocular grave, com patogênese complexa e que pode causar importante perda visual em crianças.(1) Dentre suas etiologias, uma causa importante de CC são as doenças infecciosas congênitas, referidas pelo acrônimo STORCH: Sífilis (S), toxoplasmose (T), rubéola (R), citomegalovírus (C), herpes simples (H).(2,4,5) Esses patógenos possuem a capacidade de atravessar a barreira hemato-placentária e afetar o ectoderma durante a embriogênese, tecido do qual se deriva o cristalino, levando à opacificação da lente ao nascimento, que pode ser detectada pelo teste do reflexo vermelho.(6,7)

No mundo, a CC possui incidência variável entre um e quatro de cada 10 mil nascidos vivos, sendo responsável por entre 10 e 38,8% de toda a cegueira prevenível e tratável na infância. Essa incidência costuma ser inferior em países desenvolvidos e superior em países em desenvolvimento.(8) A CC pode ocorrer como um quadro isolado ou parte de um quadro sistêmico, como em síndromes genéticas, metabólicas, induzida por drogas, traumatismos e infecções, entre outras.(2,9,10) Das causas infecciosas, a rubéola e o vírus Herpes simplex são as causas infecciosas mais comuns de catarata congênita.(11)

Durante a embriogênese, as STORCH podem produzir hipoplasia de membros, lesões oculares e cerebrais, lesões cutâneas e até mesmo o óbito.(5,12) Durante os primeiros 6 meses de vida, estímulos visuais são fundamentais para o desenvolvimento da visão no sistema nervoso central (SNC).(13) Quando há entraves para a formação da imagem na retina, o estímulo transmitido ao SNC é incapaz de fomentar o desenvolvimento normal do córtex visual, condição denominada ambliopia.(6)

A principal forma de diagnóstico da CC é o reflexo vermelho, popularmente conhecido como teste do olhinho, um exame simples, indolor e rápido de triagem neonatal.(2) Realizado por meio do oftalmoscópio direto, é feita a busca por leucocoria como achado principal, condição em que a pupila fica branca ao invés de vermelha durante o exame, como esperado.(14) Ainda, outras alterações oculares também devem ser rastreadas no teste do olhinho, como retinoblastoma, retinopatia da prematuridade, glaucoma congênito, traumas de parto, ptose e infecções.(3,10)

OBJETIVO

Identificar, na literatura, artigos sobre aspectos das infecções congênitas STORCH e a catarata congênita, para construir uma revisão de literatura sobre epidemiologia, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento por trás do desenvolvimento da catarata congênita a partir das infecções STORCH.

MÉTODOS

Foi realizada uma revisão da literatura incluindo estudos nas bases de dados PubMed®, Cochrane, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), Embase e Scientific Electronic Library Online (SciELO) de 2010 a 2023. Os descritores utilizados foram "Congenital Cataract" AND "TORCH". Os critérios de inclusão aplicados à revisão foram estudos escritos em português ou em inglês que abordassem casos de CC por algum agente STORCH.

RESULTADOS

Foram identificados 45 artigos com os termos utilizados. Após seleção por tais critérios e exclusão dos artigos repetidos, restaram 9 que foram utilizados neste trabalho. Além disso, foram selecionados outros artigos para enriquecer a discussão.

DISCUSSÃO

Catarata congênita e sífilis

O diagnóstico de S gestacional é realizado por testes sorológicos não treponêmicos e treponêmicos. Os primeiros são recomendados para o rastreio da doença e, quando positivos, justificam investigação adicional com os testes sorológicos treponêmicos.(7) A penicilina G benzatina parenteral é o tratamento padrão da S gestacional, sendo capaz de prevenir a transmissão vertical em até 98% dos casos quando instituída adequadamente.(12,15) Apesar do acrônimo STORCH fazer referência às infecções congênitas, não foram encontradas informações acerca da CC decorrente da S nesta revisão literária. Estudos ainda precisam ser desenvolvidos para avaliar essa relação e o impacto da infecção na CC.(15)

Quadro 1
Artigos selecionados na literatura
Quadro 2
Relação entre artigos selecionados e etiologia STORCH

Catarata congênita e toxoplasmose

Dentre os artigos analisados pela pesquisa de literatura, foram seis os estudos que relacionam a CC com a T. Toxoplasma gondii é o protozoário parasita responsável pela T congênita. A infecção geralmente ocorre por meio do contato com fezes de gatos infectados ou consumo de carne crua ou malcozida, ostras cruas, mariscos, mexilhões, frutas, vegetais, leite de cabra ou água contaminada com o parasita.(12,16) Aproximadamente 30% das infecções primárias pelo toxoplasma durante a gravidez resultam em transmissão vertical para o feto pela via transplacentária.(17,18)

A infecção congênita ocorre predominantemente após a infecção primária durante a fase de parasitemia em uma gestante. No entanto, também foram relatados casos de transmissão de mulheres infectadas pouco antes da gravidez e reativação de mulheres imunossuprimidas.(16) As sequelas tendem a ser mais frequentes e graves se a mãe for infectada durante o primeiro ou segundo trimestres da gravidez, o que pode resultar em morte intrauterina, aborto espontâneo ou nascimento prematuro.(16)

O quadro clínico e os testes sorológicos devem ser qualitativa e quantitativamente analisados.(9,19) A soro prevalência da T também varia muito por área geográfica. As taxas mais altas são encontradas em países da América Latina, enquanto as taxas mais baixas são relatadas no Sudeste Asiático.(20,21) No Brasil, a prevalência de soropositividade em gestantes é elevada, sendo mais frequente em mulheres com baixa condição socioeconômica e em regiões rurais.(18)

A associação entre lesões oculares e T congênita está bem estabelecida e inclui principalmente retinocoroidite, atrofia do nervo óptico, estrabismo e microftalmia, mas existe casos raros de maculopatia em torpedo.(12,22) Na maioria dos casos, a retina e a coroide são os principais tecidos oculares afetados, enquanto a íris e o cristalino são afetados pela continuidade do processo inflamatório.(5) Assim, um achado clássico nos recém-nascidos que desenvolvem catarata por T é uma cicatriz coriorretiniana extensa, podendo também vir acompanhada de descolamento de retina.(21)

Cataratas subcapsulares posteriores são observadas com mais frequência, seguidas de cataratas nucleares, subcapsulares anteriores e polares anteriores.(23) Em casos de catarata unilateral, pode-se observar diferença na avaliação clínica oftalmológica entre os dois olhos, devendo ser levado em conta para o melhor resultado cirúrgico.(24) A cirurgia de catarata pode não trazer o benefício visual esperado, visto que mesmo com a retirada do cristalino opacificado e a restituição da luz nos meios ópticos, a existência de lesões coriorretianas pela T impedem o processamento visual adequado, e o paciente não tem melhora da acuidade visual mesmo após a cirurgia.(23,25)

O tratamento farmacológico de neonatos com doença em atividade pode ser feito com uso oral de pirimetamina e sulfadiazina. O uso de corticoides é controverso e deve ser avaliado caso a caso.(12)

Catarata congênita e rubéola

A rubéola é uma infecção viral geralmente leve, ou até sintomática, caracterizada por um pródromo gripal, com sintomas catarrais, febre baixa, e linfadenopatias, seguida por uma fase de exantema rubeoliforme, de progressão craniocaudal.(12) O interesse pelo estudo dessa doença foi intensificado quando, em 1941, o oftalmologista australiano Norman McAlister Gregg identificou uma associação entre a catarata congênita e a história de rubéola materna no começo da gestação. Atualmente sabe-se que a síndrome da rubéola congênita (SRC) é uma complicação que pode acometer mais de 80% dos fetos, quando a infecção da gestante se dá nas primeiras 12 semanas de gestação, apresentando uma queda na incidência após esse período, sendo raros os defeitos congênitos quando a infecção ocorre após 20 semanas de gestação.(1,12) Muitos recém-nascidos infectados intraúteros são assintomáticos no período neonatal, e as manifestações podem ainda ter início tardio.(26) A tríade clássica de manifestação da SRC consiste em: catarata congênita, malformações cardíacas (sobretudo a persistência do canal arterial e a estenose da artéria pulmonar) e perda auditiva neurossensorial.(12) Outras manifestações oftalmológicas além da catarata também são frequentes, e consistem em glaucoma, coriorretinite "em sal e pimenta" e microftalmia.(12) Após as 20 semanas de gestação, a única sequela significativa parece ser a restrição de crescimento focal.(7) O diagnóstico da SRC pode ser confirmado pela sorologia, por meio do anticorpo anti-rubéola IgM positivo ou pela persistência ou aumento na concentração de IgG, ou ainda pela detecção do RNA viral pela reação em cadeia da polimerase (PCR) em amostras de orofaringe ou de urina.(19) Nos últimos 10 anos, uma série de estudos realizados na Índia têm reportado uma correlação importante entre a infecção congênita pelo vírus da rubéola e a presença de catarata congênita, com uma incidência de 8,4%-24,5% de anticorpos anti-rubéola IgM positivo em recém nascidos com catarata congênita.(5,7) No estudo de Malathi et al., o aspirado de lentes de crianças com catarata congênita conseguiu isolar o vírus da rubéola em 10% dos casos, confirmando a etiologia da catarata congênita.(7) É importante destacar que a imunização para rubéola na Índia é opcional, apresentando uma taxa de imunização de cerca de 50%, fator que está relacionado a uma maior incidência de rubéola na população.(9) Recentemente, o Brasil recebeu um certificado de eliminação da rubéola no território nacional, após comprovar a ausência de casos endêmicos de rubéola desde 2008, o que está diretamente relacionado à alta cobertura vacinal da tríplice viral (mais de 95%), o que reforça a importância da vacinação como melhor estratégia de prevenção da SRC.(1,7,27)

A catarata congênita causada pelo vírus da rubéola geralmente se manifesta como uma opacidade nuclear central densa, envolvida por uma opacidade cortical de menor densidade, com variável extensão em direção à periferia, sendo que essas alterações apresentam um valor preditivo positivo para SRC de 75%.(28) Isso ocorre porque o acometimento do cristalino geralmente ocorre antes da formação da cápsula do cristalino (que poderia atuar como uma barreira à penetração do vírus), levando ao desenvolvimento de uma catarata nuclear e bilateral.(29)

Não há um tratamento específico para rubéola, e o acompanhamento da SRC deve envolver uma equipe multidisciplinar para manejo das manifestações clínicas e acompanhamento do desenvolvimento.(12) Já o tratamento da catarata congênita é cirúrgico, e consiste na retirada do cristalino entre a quarta e a sexta semana de vida, podendo optar-se por uma das seguintes técnicas: facoemulsificação ou lensectomia via pars plana. Por se tratar de uma condição sistêmica, outros fatores podem afetar o prognóstico visual da facectomia na SRC, tais como a associação com retinopatia.(15)

Catarata congênita e citomegalovírus

Dentre os artigos analisados pela revisão de literatura, observou-se uma escassez de dados correlacionando a infecção do C com a CC.(24) O C é um herpesvírus que permanece no corpo humano após uma infecção primária, podendo ter sua reativação a partir do vírus latente ou reinfecção por uma cepa diferente.(5) A infecção por C representa a mais comum infecção viral congênita em todo o mundo e é uma das principais causas de perda auditiva e deficiências neurológicas na faixa etária pediátrica.(19) O C pode ser transmitido por contato direto ou indireto com os fluídos corporais infectados, como saliva, urina, sangue, sêmen ou secreções vaginais.(7)

A infecção materna por C é adquirida principalmente por meio do contato com a urina, saliva ou por relações sexuais com indivíduos infectados.(12) O C pode ser transmitido para o feto por via transplacentária, resultando em infecção congênita. O risco da transmissão vertical é de aproximadamente 36% quando a infecção materna primária ocorre durante o primeiro trimestre, enquanto no terceiro trimestre sobe para 77,6%.(5,7) Aproximadamente 10% dos recém-nascidos infectados pelo C na forma congênita são sintomáticos, e a maioria das manifestações comuns são icterícia ao nascimento, petéquias, hepatoesplenomegalia, tamanho pequeno para a idade e microcefalia.(12)

A infecção fetal por C pode ser diagnosticada por PCR para C e isolamento de DNA do vírus no líquido amniótico. Já para recém-nascidos, o isolamento do C na urina do bebê nas primeiras 2 semanas de vida é o padrão-ouro para diagnosticar infecção congênita.(12,30) Embora nenhum tratamento pré-natal tenha sido demonstrado para reduzir a infecção intraútero ou suas sequelas, o tratamento com antivirais, como o ganciclovir e valganciclovir, tem provado diminuir o risco de dano neurossensorial e a perda auditiva, além de melhorar os resultados do neurodesenvolvimento, especialmente quando o tratamento é iniciado dentro do primeiro mês de vida após o nascimento em bebês sintomáticos.(12,31) As estratégias de redução de risco devem-se concentrar na prevenção da infecção primária materna durante a gravidez.(7,32)

Em um estudo retrospectivo, Thibault et al. não encontraram associação causal entre a infecção por C e CC.(33) No entanto, em um estudo mais recente realizado por Lu et al., foi demonstrado que fatores associados a mutações no gene da proteína da catarata, como o fator de choque térmico 4 (Hsf4b), têm participado na regulação negativa do promotor C, como fator de monitoramento com função dupla de ativador e inibidor da transcrição, afetando a atividade do canal da proteína do cristalino.(5) Além disso, o C costuma causar inflamação na coroide, levando a mudanças no ambiente do cristalino, sendo a base para a formação de cataratas.(5)

Em estudo realizado por Dasgupta et al., foram triadas 1.026 crianças, das quais 46 foram diagnosticadas com CC e, destas, 67,4% (31/46) tiveram positividade do IgG para o C, reforçando a possibilidade do C como potencial agente causador de CC.(9) As manifestações oftálmicas mais comuns ocasionadas pela infecção por C intrauterino são a coriorretinite, coloboma do nervo óptico e opacidades da córnea.(12) As manifestações sistêmicas associadas são a surdez, a hemorragia em petéquias, a icterícia e a microcefalia. (27)

Catarata congênita e herpes simples

Apesar de escassa, a literatura sugere um papel importante da infecção neonatal por H no desenvolvimento de CC.(1,5) Os H são vírus da família herpesviridae que podem causar uma infecção primária e permanecer latentes durante toda a vida do indivíduo. O vírus pode voltar a se multiplicar e causar manifestações oculares, sobretudo em pacientes imunocomprometidos. Há também o risco de transmissão vertical, sobretudo durante a infecção primária, sendo 5% por via intrauterina, 85% durante o parto, e os outros 10% por contato direto com infecções ou lesões.(7)

No estudo de Patra et al., a soropositividade do herpes vírus humano tipo 1 foi presente em 27,7%, enquanto o herpes vírus humano do tipo 2 em 16,6% dos pacientes com catarata bilatera.(19) Singh et al. encontraram um resultado positivo na sorologia para IgG, bem como na análise de PCR em 20,8% (25/120) dos casos, mas apenas em 1,7% foi encontrado IgM positivo.(34) Já a série de casos de Dasgupta et al. encontrou sorologia IgG positiva para H em 22 de 46 crianças diagnosticadas com CC (47,8%), e duas dessas crianças apresentavam um quadro clínico sugestivo de infecção por H (4,3%).(9)

Analisando os resultados descritos, pode-se concluir que, em todos os estudos pesquisados, foi encontrada alta prevalência de infecção por H em crianças com CC. Sabe-se que essa doença é responsável por uma variedade de manifestações oculares e, na população pediátrica, merece destaque a CC, por ser uma doença tratável, mas com grande impacto na visão quando não diagnosticada precocemente.(12) Entretanto, devido ao baixo número de estudos encontrados, ainda é necessário um maior espaço amostral para confirmar que a infecção por H neonatal é um fator causal para o desenvolvimento de CC.(35)

O tratamento recomendado para herpes neonatal consiste em altas doses de aciclovir endovenoso (EV), seguido por terapia oral para reduzir complicações neurológicas.(12) É também importante realizar profilaxia com aciclovir EV caso a mãe apresente lesões genitais ou então optar pela via de parto cesariana. Também pode ser iniciado o tratamento materno a partir de 36 semanas, com o objetivo de reduzir as lesões genitais.(12) Além disso, é importante prevenir a transmissão após o nascimento, pois cerca de 10% dos casos podem ser adquiridos por meio de contato próximo extrauterino.(36)

COMENTÁRIO

O sucesso visual no desfecho da catarata congênita infecciosa relaciona-se com a precocidade do diagnóstico e do correto tratamento instituído. A maioria das apresentações de catarata congênita é tratável cirurgicamente, mas pode evoluir com ambliopia e perda visual irreversível, na ausência de tratamento adequado.

O rastreio para alterações oftalmológicas ocasionadas pelos STORCH é indispensável.(1,5) Desde o pré-natal, devem ser realizados exames de triagem e laboratoriais para seu diagnóstico e, após o nascimento, o teste do reflexo vermelho, para identificar possíveis opacidades do cristalino associadas.(12)

É de suma importância a prevenção das infecções pelos STORCH, principalmente durante a gestação. O método mais eficaz é a prevenção por meio da vacinação da gestante contra os agentes infecciosos e, principalmente, a rubéola.(1) Dessa forma, o aconselhamento dos pais é indispensável, assim como a necessidade de garantir o tratamento e o acompanhamento regular otimizado para um melhor desfecho visual e melhor qualidade dos infantes.

Apesar da escassez de artigos encontrados na literatura sobre as STORCH, é importante o investimento em políticas de saúde pública para a gestante e para acompanhamento do pré-natal, visto que o diagnóstico precoce e o tratamento correto possuem os melhores desfechos clínicos e a melhor qualidade de vida para a criança.

  • Instituição de realização do trabalho: Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
  • Fonte de auxílio à pesquisa: não financiado.

REFERÊNCIAS

  • 1 Lenhart PD, Lambert SR. Current management of infantile cataracts. Surv Ophthalmol. 2022 Sep 1;67(5):1476–505.
  • 2 Allen LE. Childhood cataract. Paediatr Child Health. 2020 Jan 1;30(1):28–32.
  • 3 Devaraju M, Li A, Ha S, Li M, Shivakumar M, Li H, et al. Beyond TORCH: A narrative review of the impact of antenatal and perinatal infections on the risk of disability. Neurosci Biobehav Rev. 2023 Oct 1;153:105390.
  • 4 Mohammadpour M, Shaabani A, Sahraian A, Momenaei B, Tayebi F, Bayat R, et al. Updates on managements of pediatric cataract. J Curr Ophthalmol. 2019 Jun 1;31(2):118–26.
  • 5 Lu B, Yang Y. Detection of TORCH pathogens in children with congenital cataracts. Exp Ther Med [Internet]. 2016 Aug 1 [cited 2023 Feb 21];12(2):1159–64. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27446337
    » http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27446337
  • 6 Kirschen GW, Panda S, Burd I. Congenital Infection Influence on Early Brain Development Through the Gut-Brain Axis. Front Neurosci [Internet]. 2022 Jun 30 [cited 2023 Nov 6];16. Available from: /pmc/articles/PMC9280077/
  • 7 Leung KKY, Hon KL, Yeung A, Leung AKC, Man E. Congenital infections in Hong Kong: An overview of TORCH. Hong Kong Medical Journal. 2020 Apr 1;26(2):127–38.
  • 8 Wu X, Long E, Lin H, Liu Y. Prevalence and epidemiological characteristics of congenital cataract: a systematic review and meta-analysis. Sci Rep [Internet]. 2016 Jun 23 [cited 2023 Nov 6];6. Available from: /pmc/articles/PMC4917826/
  • 9 Dasgupta S, Shakeel T, Roy RC. ToRCH-screening in pediatric cataract revisited: A North Indian tertiary care centre study. Indian J Ophthalmol. 2020;68(5):769–75.
  • 10 Hon KL, Leung KKY, Leung AKC, Man E, Ip P. Congenital infections in Hong Kong: beyond TORCH. Hong Kong Med J [Internet]. 2020 Aug 1 [cited 2023 Feb 21];26(4):323–30. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32705996/
  • 11 Luo H, Faghankhani M, Cao Y, Uitto J, Li Q. Molecular Genetics and Modifier Genes in Pseudoxanthoma Elasticum, a Heritable Multisystem Ectopic Mineralization Disorder. Journal of Investigative Dermatology. 2021 May 1;141(5):1148–56.
  • 12 Leeper C, Lutzkanin A. Infections During Pregnancy. Primary Care - Clinics in Office Practice. 2018 Sep 1;45(3):567–86.
  • 13 Ramenghi LA, Ricci D, Mercuri E, Groppo M, De Carli A, Ometto A, et al. Visual performance and brain structures in the developing brain of pre-term infants. Early Hum Dev [Internet]. 2010 [cited 2023 Nov 6];86 Suppl 1(SUPPL. 1):73–5. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/20153942/
    » https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/20153942/
  • 14 Walker S, Harris Z. Detecting the serious visual disorders of childhood. Paediatr Child Health. 2012 Jan 1;22(1):25–30.
  • 15 De Santis M, De Luca C, Mappa I, Spagnuolo T, Licameli A, Straface G, et al. Syphilis Infection during Pregnancy: Fetal Risks and Clinical Management. Infect Dis Obstet Gynecol [Internet]. 2012 [cited 2023 Nov 6];2012. Available from: /pmc/articles/PMC3398589/
  • 16 McAuley JB. Congenital Toxoplasmosis. J Pediatric Infect Dis Soc [Internet]. 2014 [cited 2023 Nov 6];3(Suppl 1):S30. Available from: /pmc/articles/PMC4164182/
  • 17 Kieffer F, Wallon M. Congenital toxoplasmosis. Handb Clin Neurol. 2013 Jan 1;112:1099–101.
  • 18 Da Silva MG, Vinaud MC, De Castro AM. Prevalence of toxoplasmosis in pregnant women and vertical transmission of Toxoplasma gondii in patients from basic units of health from Gurupi, Tocantins, Brazil, from 2012 to 2014. PLoS One [Internet]. 2015 Nov 1 [cited 2023 Nov 6];10(11). Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26558622/
    » https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26558622/
  • 19 Patra A, Parija S, Parida PK, Behera SK, Ghosh A. Seroprevalence of ToRCH Pathogens among children admitted to a tertiary care hospital in Eastern India for cataract surgery and Cochlear transplantation. Curr Pediatr Rev [Internet]. 2023 Feb 15 [cited 2023 Nov 6];19. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36809946/
    » https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36809946/
  • 20 Robert-Gangneux F, Dardé ML. Epidemiology of and Diagnostic Strategies for Toxoplasmosis. Clin Microbiol Rev [Internet]. 2012 Apr [cited 2023 Nov 6];25(2):264. Available from: /pmc/articles/PMC3346298/
  • 21 Montoya JG, Contopoulos-Ioannidis D. Toxoplasmosis. 2021 [cited 2023 Nov 6];69–91. Available from: https://link.springer.com/chapter/10.1007/978-3-030-63384-4_5
    » https://link.springer.com/chapter/10.1007/978-3-030-63384-4_5
  • 22 Khurram D, Ali SM, Nguyen QD, Kozak I. Congenital ocular toxoplasmosis with torpedo maculopathy and retinopathy of prematurity in a premature baby. Am J Ophthalmol Case Rep [Internet]. 2021 Sep 1 [cited 2023 Feb 21];23:101121. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/34095608
    » http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/34095608
  • 23 Arun V, Noble AG, Latkany P, Troia RN, Jalbrzikowski J, Kasza K, et al. Cataracts in Congenital Toxoplasmosis. Journal of AAPOS : the official publication of the American Association for Pediatric Ophthalmology and Strabismus / American Association for Pediatric Ophthalmology and Strabismus [Internet]. 2007 Dec [cited 2023 Nov 6];11(6):551. Available from: /pmc/articles/PMC2194289/
  • 24 Kun L, Szigeti A, Bausz M, Nagy ZZ, Maka E. Preoperative biometry data of eyes with unilateral congenital cataract. J Cataract Refract Surg. 2018 Oct 1;44(10):1198–202.
  • 25 Jammal HM, Khader Y, Shawer R, Bdour M Al. Posterior segment causes of reduced visual acuity after phacoemulsification in eyes with cataract and obscured fundus view. Clin Ophthalmol [Internet]. 2012 Nov 6 [cited 2023 Nov 6];6(1):1843. Available from: /pmc/articles/PMC3497462/
  • 26 Shweta B, Nupur G, Archana A, Inderjeet G, Suman G, Manisha B, et al. The study of congenital cytomegalovirus, Rubella and Herpes Simplex Virus-2 infections in infants. Apollo Medicine. 2015 Mar 1;12(1):11–4.
  • 27 Singh V, Badakere A, Patil-Chhablani P, Kekunnaya R. Profile of congenital cataract in the first year of life from a tertiary care center in South India - A modern series. Indian J Ophthalmol. 2021 Apr 1;69(4):932–6.
  • 28 Vijayalakshmi P, Kakkar G, Samprathi A, Banushree R. Ocular manifestations of congenital rubella syndrome in a developing country. Indian J Ophthalmol [Internet]. 2002 Dec [cited 2023 Nov 7];50(4):307. Available from: https://journals.lww.com/ijo/pages/default.aspx/article.asp?issn=0301-4738;year=2002;volume=50;issue=4;spage=307;epage=311;aulast=Vijayalakshmi
    » https://journals.lww.com/ijo/pages/default.aspx/article.asp?issn=0301-4738;year=2002;volume=50;issue=4;spage=307;epage=311;aulast=Vijayalakshmi
  • 29 Joshi D, Krishnaprasad R, Agrawal A. Is 20/20 visual outcome a reality in rubella cataract? - Prognostic factors in children with cataract associated with congenital rubella syndrome. Indian J Ophthalmol [Internet]. 2021 Mar 1 [cited 2023 Nov 7];69(3):598. Available from: /pmc/articles/PMC7942125/
  • 30 Nagel A, Dimitrakopoulou E, Teig N, Kern P, Lucke T, Michna D, et al. Characterization of a universal screening approach for congenital CMV infection based on a highly-sensitive, quantitative, multiplex real-time PCR assay. PLoS One [Internet]. 2020 Jan 1 [cited 2023 Nov 7];15(1):e0227143. Available from: https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0227143
    » https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0227143
  • 31 Ssentongo P, Hehnly C, Birungi P, Roach MA, Spady J, Fronterre C, et al. Congenital Cytomegalovirus Infection Burden and Epidemiologic Risk Factors in Countries With Universal Screening: A Systematic Review and Meta-analysis. JAMA Netw Open [Internet]. 2021 Aug 2 [cited 2023 Nov 7];4(8):e2120736–e2120736. Available from: https://jamanetwork.com/journals/jamanetworkopen/fullarticle/2783304
    » https://jamanetwork.com/journals/jamanetworkopen/fullarticle/2783304
  • 32 Tol I, Heath PT, Khalil A. Prevention strategies for congenital cytomegalovirus infection. Curr Opin Infect Dis [Internet]. 2021 Oct 1 [cited 2023 Nov 7];34(5):546–51. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34334662/
    » https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34334662/
  • 33 Thibault M, Leydet J, Tournier-Lasserve E, Crow YJ, Rivier F, Echenne B, et al. Genetic syndromes that mimic congenital infections: Report of 2 cases. Archives de Pediatrie. 2011;18(12):1292–6.
  • 34 Singh MP, Ram J, Kumar A, Khurana J, Marbaniang M, Ratho RK. Infectious agents in congenital cataract in a tertiary care referral center in North India. Diagn Microbiol Infect Dis [Internet]. 2016 Aug 1 [cited 2023 Nov 7];85(4):477–81. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27236713/
    » https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27236713/
  • 35 Sheeladevi S, Lawrenson JG, Fielder AR, Suttle CM. Global prevalence of childhood cataract: a systematic review. Eye 2016 30:9 [Internet]. 2016 Aug 12 [cited 2023 Nov 5];30(9):1160–9. Available from: https://www.nature.com/articles/eye2016156
    » https://www.nature.com/articles/eye2016156
  • 36 Pinninti SG, Kimberlin DW. Neonatal herpes simplex virus infections. Semin Perinatol. 2018 Apr 1;42(3):168–75.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    08 Out 2023
  • Aceito
    07 Fev 2024
location_on
Sociedade Brasileira de Oftalmologia Rua São Salvador, 107 , 22231-170 Rio de Janeiro - RJ - Brasil, Tel.: (55 21) 3235-9220, Fax: (55 21) 2205-2240 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rbo@sboportal.org.br
rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
Acessibilidade / Reportar erro