Open-access Perfil dos estudantes que cursam enfermagem: qualidade de vida, sono e hábitos alimentares

RESUMO

Objetivo:  traçar o perfil e analisar a qualidade do sono, qualidade de vida e hábitos alimentares dos estudantes de enfermagem.

Métodos:  estudo transversal, comparativo e correlacional com as seguintes variáveis: características sociodemográficas, índice de qualidade de sono de Pittsburgh, qualidade de vida e hábitos alimentar. 195 estudantes participaram do estudo.

Resultados:  os participantes tinham em média 24 anos. Os resultados demonstraram que o sexo feminino foi prevalente (87,1%); 71,0% dos estudantes apresentaram qualidade de sono ruim; 98,9% faziam uso de aparelhos eletrônicos antes de dormir. A autopercepção da qualidade de vida foi indiferente (38,3%) e quanto à autopercepção de saúde geral, 36,9% expressaram-se satisfeitos. Dentre os participantes, 45,13% consumiam uma porção de fruta e 40,66% duas a três porções de verduras e legumes, diariamente.

Conclusão:  o estudo permitiu traçar o perfil desses estudantes, jovens que estudavam e trabalhavam, sedentários, acima do peso e com qualidade de sono ruim.

Descritores: Estudantes de Enfermagem; Sono; Qualidade de Vida; Comportamento Alimentar; Inquéritos e Questionários

ABSTRACT

Objective:  to profile and analyze sleep quality, quality of life and eating habits of nursing students.

Methods:  a cross-sectional, comparative and correlational study with the following variables: sociodemographic characteristics, Pittsburgh sleep quality index, quality of life and eating habits. One hundred ninety-five students participated in the study.

Results:  participants were on average 24 years old. Results showed that females were prevalent (87.1%); 71.0% of the students had poor sleep quality; 98.9% used electronic devices before bedtime. Self-perception of quality of life was indifferent (38.3%), and self-perception of general health, 36.9% expressed satisfaction. Among the participants, 45.13% consumed one portion of fruit and 40.66% two to three portions of vegetables daily.

Conclusion:  the study allowed the profile of these students, sedentary, overweight and poor sleep quality young students who studied and worked.

Descriptors: Students, Nursing; Sleep; Quality of Life; Feeding Behavior; Surveys and Questionnaires

RESUMEN

Objetivo:  identificar lo perfil y analizar la calidad del sueño, la calidad de vida y los hábitos alimenticios de los estudiantes de enfermería.

Métodos:  estudio transversal, comparativo y correlacional con las siguientes variables: características sociodemográficas, índice de calidad del sueño de Pittsburgh, calidad de vida y hábitos alimenticios. 195 estudiantes participaron en el estudio.

Resultados:  los participantes tenían en promedio 24 años de edad. Los resultados mostraron que las mujeres eran prevalentes (87.1%); El 71.0% de los estudiantes tenían mala calidad del sueño; El 98.9% usó dispositivos electrónicos antes de acostarse. La autopercepción de la calidad de vida fue indiferente (38.3%), y la autopercepción de la salud general, 36.9% expresó satisfacción. Entre los participantes, el 45.13% consumió una porción de fruta y el 40.66% dos o tres porciones de vegetales diariamente.

Conclusión:  el estudio permitió el perfil de estos estudiantes, estudiantes sedentarios, con sobrepeso y con poca calidad del sueño que estudiaron y trabajaron.

Descriptores: Estudiantes de Enfermería; Sueño; Calidad de Vida; Conducta Alimentaria; Encuestas y Cuestionarios

INTRODUÇÃO

Estudantes enfrentam ao longo da vida universitária vários fatores estressores, alguns podem favorecer o desenvolvimento e crescimento profissional(1) e outros podem prejudicar o bem-estar(2), a saúde e a qualidade de vida(3).

Durante o processo de aprendizagem, os estudantes de enfermagem se deparam com diversas situações, como grande demanda acadêmica e excesso de responsabilidades(4-6); vivenciam situações até então desconhecidas, como o uso de termos médicos, os diagnósticos e tratamentos dos pacientes, o cuidado ao paciente, a falta de habilidades profissionais para o uso de equipamentos e a possibilidades de erros(7). No campo interpessoal, destacam-se as relações com professores, colegas e profissionais de saúde(5).

Agregado a estes fatores, têm-se os estudantes de enfermagem que trabalham e estudam, condição desfavorável enfrentada que pode refletir de modo prejudicial no processo de ensino-aprendizagem. Muitos deles chegam atrasados ou dormem durante as aulas(8-10).

O sono é condição essencial para a sobrevivência(11), sendo uma função biológica fundamental na consolidação da memória, na visão binocular, na termorregulação, na conservação e restauração da energia(12), e na restauração do metabolismo energético cerebral(13). A média de sono diária é uma característica individual, que varia de 7 a 8 horas(12). Devido a essas importantes funções, as perturbações do sono podem acarretar alterações significativas no funcionamento físico, ocupacional, cognitivo e social do indivíduo, além de comprometer substancialmente a qualidade de vida(14-16). Estudos recentes demonstraram que estudantes de graduação de diversas áreas do conhecimento, incluindo a enfermagem, apresentaram uma qualidade de sono ruim(8,17-20).

Nos estudantes universitários, a duração do sono é menor durante a semana do que nos finais de semana, visto que os estudantes enfrentam privações do sono durante os dias de aula ou de trabalho, podendo ocasionar repercussões negativas em relação à saúde(21). A diminuição do ciclo sono-vigília pode ocorrer pelas altas demandas acadêmicas, hábito alimentar inadequado, atividade física irregular, uso abusivo de drogas e álcool e a ansiedade para o desenvolvimento de um bom desempenho acadêmico(22).

Ao saírem do ensino médio e adentrarem na universidade, os acadêmicos podem ter dificuldades com a sua própria alimentação e sofrer influências de vários fatores, como as novas relações sociais, consumo de fast foods, instabilidade psicossocial, estresse, não realização de refeições, consumo de álcool e cigarros(23).

Diante de todo esse universo, a saúde e a qualidade de vida desses estudantes podem estar comprometidas. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a qualidade de vida pode ser definida como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive, e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. A saúde “é um estado de completo bem-estar físico, mental e social” e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade(24).

OBJETIVO

Traçar o perfil e analisar a qualidade do sono, qualidade de vida e hábitos alimentares dos estudantes de enfermagem.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), obtendo Parecer favorável via Plataforma Brasil. Os participantes foram esclarecidos quanto aos objetivos da pesquisa, da natureza voluntária da participação, da garantia de sigilo de suas respostas e do preenchimento do “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido”.

Desenho, local do estudo e período

Estudo transversal, descritivo e comparativo, com abordagem correlacional, realizado com estudantes de Graduação em Enfermagem de uma Instituição de Ensino Superior (IES) particular do interior do estado de São Paulo.

A coleta foi realizada em outubro de 2017, no turno noturno, em sala de aula, mediante a autorização da coordenação e dos professores. Os instrumentos da coleta foram entregues aos estudantes, que tiveram cerca de 30 minutos para o preenchimento dos questionários e devolvê-los.

O instrumento utilizado do Equator para nortear a metodologia do presente estudo foi o checklist STROBE (Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology).

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

Participaram os discentes matriculados no segundo, quarto, sexto e oitavo períodos, no segundo semestre do ano letivo de 2017, um total de 232 estudantes.

Adotaram-se como critérios de inclusão, de ambos os sexos, ser estudantes regularmente matriculados, e de exclusão, estar de licença médicas ou maternidade, não ter devolvido os instrumentos utilizados no estudo no prazo determinado. No final, obteve-se um total de 195.

Protocolo do estudo

Para a caracterização sociodemográfica, foi elaborado um questionário com informações sobre faixa etária, sexo, estado civil, filhos, trabalho, atividade física, tabagismo, uso de aparelhos eletrônicos antes de dormirem. Para a coleta sobre o perfil alimentar, aplicou-se um questionário referente aos hábitos alimentares diários do desjejum, almoço, jantar e consumo diário de frutas, verduras e legumes, consumo de refrigerante e quantidade diária de água. Os estudantes auto-referiram peso (Kg) e altura (m) para o cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC). Utilizou-se o WHOQOL-BREF para a coleta de dados sobre a qualidade de vida, que se reporta aos últimos 15 dias vividos pelos respondentes, com 26 questões, entre elas, duas perguntas gerais que fazem referência à percepção da qualidade de vida e à satisfação com a saúde. As demais representam as 24 facetas que compõem o instrumento original e estão distribuídas em quatro domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente(24). As questões do WHOQOL-BREF são formuladas para respostas em escalas tipo Likert que variam de um a cinco. Os resultados dos domínios apresentam valores entre zero e cem, sendo os piores os mais próximos de zero e, melhores, os mais próximos de cem, sendo que médias mais altas sugerem melhor percepção de qualidade de vida(25).

O Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (PSQI), desenvolvido por Buysse (1989)(26), foi utilizado para avaliar a qualidade do sono através de um questionário padronizado. Esse questionário avalia a qualidade do sono ao longo de um intervalo de tempo de um mês, sendo composto por 19 questões autoaplicáveis. As 19 questões são categorizadas em sete componentes, graduadas em um escore que varia de 0 a 3. Os componentes do PSQI são: componente 1, qualidade subjetiva do sono; componente 2, latência do sono; componente 3, duração do sono; componente 4, eficiência habitual do sono; componente 5, distúrbios do sono; componente 6, uso de medicação para dormir; componente 7, disfunção diurna. A soma das pontuações para esses 7 componentes produz um escore global, que varia de 0 a 21, sendo que o maior escore indica pior qualidade do sono. Um escore global do PSQI maior que 5 indica maiores dificuldades em pelo menos 2 componentes ou dificuldades moderadas em mais de 3 componentes. O PSQI-BR e o PSQI original apresentaram por meio de avaliação do Alfa de Cronbach uma consistência interna de 0,73 e 0,75, respectivamente, quando aplicados a um grupo de indivíduos bilíngues(27).

Análise dos resultados e estatística

Para todas as análises foi utilizado os softwares estatísticos SAS, versão 9.4 e SPSS versão, 22. As correlações entre as variáveis quantitativas foram avaliadas por meio do coeficiente de correlação de Pearson ou Spearman(28), de acordo com a distribuição dos dados. Para estudar as associações entre as variáveis qualitativas, foram aplicados o Teste Qui-Quadrado(29) e o Teste Exato de Fisher(30).

RESULTADOS

Dos participantes, 41,15% eram residentes da mesma cidade onde se localizava a IES, os demais residiam em cidades da região. A Tabela 1 apresenta os dados sociodemográficos, profissionais e hábitos de vida da amostra estudada em porcentagem e número absoluto. Uma grande parcela referiu morar com parentes, ter condução própria, utilizar transportes escolares para chegar à instituição, ter cursado o ensino médio em escola pública, não praticar atividade física e ter emprego nos períodos da manhã e tarde. 56,48% dos participantes eram responsáveis pelo custeio dos estudos, por se tratar de uma IES particular. Dentre os participantes, 52,06% ingeria bebida alcoólica e 90,77% não eram tabagistas. Quando questionados quanto ao uso de aparelhos eletrônicos, como celular, tablet e notebook antes de dormir, 98,97% referiram fazer uso.

Tabela 1
Características sociodemográficas, ocupacionais e hábitos de vida segundo os discentes matriculados no curso de enfermagem (n=195), São João da Boa Vista, São Paulo, Brasil, 2017

Quanto às características do comportamento alimentar, a maioria dos participantes realizava de duas a três refeições diárias. Os alimentos mais consumidos no desjejum foram leite (38,46%), café (40,00%) e pães, cereais, bolos e biscoitos industrializados (37,95%). O total dos participantes respondeu que realizava o almoço. Os alimentos mais consumidos foram arroz (92,82%), feijão (81,54%), carne bovina (81,54%), verduras (69,23%), carne de frango (62,05%) e legumes (61,54%), no jantar foram arroz (45,36%), carne bovina (40,72%), feijão (40,21%) e verduras (34,02%).

Em relação aos hábitos alimentares, observou-se que 45,13% consumiam uma porção de fruta e 40,66% de duas a três porções de verduras e legumes por dia. Quanto ao consumo de refrigerante, 29,90% consumiam de duas a três vezes por semana e 17,01% não consumiam. Dos participantes, 50,26% não consumiam fast food, 37,95% ingeriam de 500 mililitros a 1 litro de água diariamente e 36,92% ingeriam de 1 a 2 litros.

Na Tabela 2, pode-se observar os valores de média de idade, das medidas antropométricas e índice do IMC desses participantes.

Tabela 2
Valores médios de peso, altura e índice de massa corporal dos discentes em enfermagem (n=195), São João da Boa Vista, São Paulo, Brasil, 2017

Na análise da qualidade de vida pelo WHOQOL-BREF, observa-se na Figura 1 as respostas dos sujeitos quanto à percepção de qualidade de vida. Em relação à percepção de saúde, 36,98% responderam estar “satisfeitos”.

Figura 1
Distribuição das frequências das respostas de percepção de qualidade de vida geral dos discentes de enfermagem

Quanto aos domínios avaliados pelo WHOQOL-BREF, pode-se observar uma diferença relativa entre os domínios (Tabela 3). O domínio social apresentou o maior valor médio dos escores e o menor valor mínimo dentre os quatro domínios. O domínio físico teve o segundo maior escore, entretanto apresentou o maior valor mínimo.

Tabela 3
Valores médios do WHOQOL-BREF dos discentes em enfermagem, São João da Boa Vista, São Paulo, Brasil, 2017 (n=195)

Em relação ao Índice de qualidade de sono de Pittsburgh, observou-se que 71,05% dos discentes apresentaram qualidade de sono “ruim”.

A Tabela 4 demonstra a média do escore da qualidade do sono apresentado pelos participantes, a média de horas que permaneciam no leito e a eficiência de sono. Quanto à latência do sono, pôde-se observar que 49,12% estudantes, em média, demoravam de 31 a 60 minutos para pegar no sono. Em relação ao uso de medicamentos para dormir, 81,58% referiram não usá-los.

Tabela 4
Valores médios do escore do Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh, das horas no leito e da eficiência habitual do sono dos discentes em enfermagem. São João da Boa Vista, São Paulo, Brasil, 2017

Pôde-se observar associação de insônia em relação aos períodos do curso, onde, no segundo, quarto e sexto período a maioria respondeu não ter insônia; no oitavo período, respondeu ter insônia com diferença estatística significante pelo Teste Qui-Quadrado (p=0,0201).

Observaram-se as correlações dos domínios do WHOQOL-BREF, do escore geral do PSQI, do peso e do IMC. Verificou-se correlação negativa, moderada e estatisticamente significativa entre todos os domínios do WHOQOL-BREF e o escore geral do PSQI, indicando que, quando o valor do escore do PSQI aumenta, os valores dos domínios do WHOQOL-BREF diminuem.

Observou-se correlação positiva, forte e estatisticamente significativa entre o domínio físico do WHOQOL-BREF com os domínios psicológico e social; do domínio psicológico com o domínio ambiental; e, do peso com o IMC, e correlação positiva, moderada e estatisticamente significativa entre o domínio físico e o domínio ambiental; do domínio psicológico com o domínio social; e, do domínio social com o ambiental, indicando que quanto maior a qualidade de vida no domínio físico, maior será a qualidade de vida nos outros domínios, e quanto maior o peso, maior será o IMC.

DISCUSSÃO

A enfermagem tem se caracterizado como uma profissão feminina pelo número expressivo de mulheres que integram a profissão. Historicamente, as mulheres sempre desempenharam o papel de cuidadoras, buscando construir e conquistar seu espaço no mundo do trabalho e na sociedade(31). No presente estudo, com estudantes de Enfermagem, podemos observar essa realidade, com a predominância do sexo feminino, resultado semelhante foi averiguado na pesquisa desenvolvida com estudantes de outra universidade(32) e em outros estudos(33). A maioria dos participantes deste estudo eram solteiros e sem filhos. Resultados próximos foram encontrados em estudo com estudantes de enfermagem da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul(32). A média da faixa etária mostrou uma população jovem, com atividade laboral concentrada nos períodos da manhã e tarde, semelhante a um estudo com estudantes de enfermagem do Vale do Paraíba(34).

Sabe-se que a prática de atividade física traz benefícios para a saúde em geral. Referente a esse item, uma grande parcela dos participantes relatou não praticar atividade física em relação aos que praticavam. Resultado semelhante foi encontrado em outro estudo com estudantes de Enfermagem da Universidade de Natal (UFRN)(35).

Observou-se uma frequência maior de ingestão de bebidas alcoólicas dentre os participantes, um dado preocupante, visto que não se recomenda tal consumo por motivos sociais e nutricionais, quando comparado a outros estudos, com universitários da área da saúde, onde a maioria dos acadêmicos referiram nunca consumir bebidas alcoólicas(36), e com estudantes de nutrição e enfermagem, em que quase metade não consumiam bebidas alcoólicas(37). Em relação ao consumo de cigarros, houve predomínio dos participantes não fumantes, similar a universitários libaneses(38).

Sobre o comportamento alimentar dos participantes, grande parcela realizava de 1 a 4 refeições diárias, semelhante ao estudo com universitários do interior da Bahia(39). A adoção de uma alimentação saudável contribui para a prevenção de doenças cardíacas, obesidade, alguns tipos de câncer, além de outras enfermidades crônicas, como o diabetes.

Os participantes deste estudo consumiam o desjejum regularmente, almoçavam, e um pouco mais da metade referira que jantava com regularidade. Esse resultado corrobora com um estudo com universitários catarinenses(40). Os hábitos alimentares da população pesquisada possuíam características semelhante à dieta tradicional brasileira, com consumo do feijão com arroz(40).

O Guia Alimentar para a População Brasileira (GAPB)(41) traz como recomendação de consumo de água, pelo menos, dois litros (seis a oito copos) de água por dia. A maioria dos participantes deste estudo referiram que consumiam de 500 mililitros a um litro, e uma boa parcela consumia de um a dois litros diariamente. Quanto ao consumo de fast foods, metade dos participantes não consumia e um pouco mais que um terço deles consumia uma vez por semana. Um estudo realizado em cursos da área da saúde de uma universidade particular de Goiás constatou que 35,1% dos acadêmicos consumiam fast foods, com frequência, de uma a quatro vezes por mês(36). O valor médio do IMC dessa população, segundo os critérios de classificação da OMS, se caracterizou em sobrepeso (valor médio do IMC: 25,61 kg/m2) a adequado (considerando o desvio padrão igual a 5,02), pois a OMS traz como valores de referência de IMC entre 18,5 e 24,9 kg/m², como adequado, e entre 25,0 e 29,9 kg/m², como sobrepeso(42). Esses resultados diferem, quando comparados ao estudo realizado com acadêmicos de enfermagem da Turquia(33)e estudantes de medicina do Rio de Janeiro, onde observou-se um IMC classificado como peso adequado(42). Pode-se dizer que os maus hábitos de vida, destacando a falta de prática de atividade física e a rotina estressante de trabalhar e cursar uma graduação no turno noturno, podem contribuir para a prevalência de sobrepeso nessa população.

Nas questões gerais sobre qualidade dedo WHOQOL-BREF, os resultados observados neste estudo mostraram que 38,34% dos estudantes avaliaram sua qualidade de vida geral como nem ruim nem boa, e também 38,34% como boa, e em relação à percepção de saúde, 36,98% estavam satisfeitos com sua saúde. Um estudo realizado em seis cursos de enfermagem, da Região Sul do Brasil, difere do presente estudo e mostrou que 72% dos respondentes classificaram sua qualidade de vida como boa ou muito boa, e 32,3%, incluindo os ‘muito insatisfeitos’, os ‘insatisfeitos’ e os ‘nem satisfeitos nem insatisfeitos’, responderam quão satisfeitos estão com sua saúde(43). Outro estudo, com acadêmicos de enfermagem de Brasília, demonstrou que 85,4% dos entrevistados avaliaram sua qualidade de vida como boa ou muito boa e 34,6% afirmaram estar insatisfeitos ou nem satisfeitos nem insatisfeitos com sua saúde(44). Quanto aos domínios avaliados através do WHOQOL-BREF, pôde-se observar que houve uma diferença entre o domínio meio ambiente aos demais domínios. O domínio social apresentou os maiores escores. O domínio físico foi o segundo, seguido do domínio psicológico e o domínio meio ambiente apresentou a menor média entre os quatro. Resultados semelhantes que partilham com os obtidos neste trabalho, foram encontrados em dois estudos realizados em cursos de enfermagem(43-44), e cursos da área da saúde(45).

A maioria dos participantes apresentou qualidade de sono ruim. Esses dados estão de acordo com a literatura, corroborando o estudo realizado com estudantes de enfermagem da Turquia (34), dos Estados Unidos(46) e também está de acordo com estudos realizados com estudantes universitários em geral(19) e com estudantes de medicina(42). Em relação à componente eficiência habitual do sono, foi determinado para a maioria dos participantes uma eficiência do sono maior que 85%. Esse resultado foi bem diferente ao estudo na Universidade Federal do Ceará, que classificou o componente na pior faixa para eficiência habitual do sono(19). Quanto à latência do sono, quase metade dos participantes indicou que demorava, em média, de 31 a 60 minutos para pegar no sono, dado este que difere do estudo realizado na Universidade Federal do Ceará, em que boa parte dos estudantes entrevistados apontou que levava 15 minutos ou menos para adormecer no último mês(19).

Contudo, é fato que os adventos tecnológicos, como notebook, tablet e principalmente celulares, com acesso à internet, são fatores que podem prejudicar o início do sono. Os estudantes rotineiramente reservam os espaços livres à noite ou ainda àqueles referentes ao horário de repouso para utilizar de serviços como e-mail, redes sociais, filmes e jogos. Um estudo com adolescentes japoneses de uma escola pública de ensino médio constatou que longas horas de uso de telefones celulares foram associadas à insônia, particularmente em estudantes que utilizam telefones celulares por cinco horas ou mais por dia(47). Outro estudo sobre o impacto do uso excessivo de celulares e redes sociais e a qualidade do sono em estudantes de medicina do Irã concluiu que a má qualidade do sono está intimamente associada aos hábitos de vida, incluindo o uso de celulares(48). Os participantes do estudo responderam questões sobre o uso de aparelhos eletrônicos, como celular, tablet e notebook antes de dormir. Quase o total deles fazia uso desses aparelhos, e 40,1% classificou a qualidade do sono, após o uso desses aparelhos, como boa, apesar do escore do PSQI classificar o sono desses estudantes como qualidade ruim.

Os acadêmicos avaliados apresentaram uma média de duração do sono de 6,49 horas por noite, semelhante ao estudo com os universitários de Fortaleza, que apresentou uma média de 6,3 horas por noite(19). Vale ressaltar que a privação do sono é um fator preocupante, uma vez que gera diminuição do desempenho acadêmico(42).

Em uma pesquisa(49) com estudantes do ensino superior, verificou-se uma correlação negativa e significante entre os domínios físico, psicológico, social e ambiental do WHOQOL-BREF e o PSQI. Resultado semelhante foi obtido também em um estudo com estudantes universitários de Ciências Médicas(50). Combina-se com os resultados do presente estudo, demonstrando que a qualidade do sono tem impacto na qualidade de vida dos estudantes, em todos os seus domínios, podendo prejudicar o rendimento acadêmico, ou seja, quanto melhor a qualidade de sono, melhor a qualidade de vida.

Os estudantes do oitavo período foram os que mais afirmaram ter insônia. Esse fato possivelmente se deve à intensificação das exigências acadêmicas, nas diferentes oportunidades da área de ensino e pesquisa, a necessidade de trabalhar para a própria manutenção, a proximidade da conclusão do curso de graduação e suas responsabilidades e, ainda, a expectativa de vida como formando egresso/profissional. Esse dado também foi demonstrado em um estudo com estudantes de enfermagem italianos, onde foi observado que a alteração do padrão de sono foi frequente, sendo a prevalência de insônia e ocorrendo aumento dessa alteração com o avançar da idade dos estudantes(20).

Limitações do estudo

Como uma das limitações do estudo, identificou-se o número de participantes avaliados de uma única instituição, sendo caracterizado um número limitado, o que pode não corresponder à generalização dos dados obtidos, apontando para a necessidade de futuras pesquisas que contemplem outras instituições para comparação do desempenho acadêmico e sua relação com os padrões de vida, alimentar e a qualidade de sono. Recomenda-se que outros estudos sejam conduzidos por maior período e com maior amostra.

Contribuições para a área da enfermagem

Os resultados provenientes deste estudo podem contribuir para o delineamento de estratégias que permitam identificar as dificuldades vivenciadas por esses estudantes no âmbito ambiental, psicológico, social e físico, favorecendo a busca por soluções para os conflitos que incidem na qualidade de vida. Portanto, o presente estudo sugere que as universidades brasileiras criem espaços para a promoção da saúde desses estudantes de enfermagem no âmbito da qualidade de vida, promovendo o desenvolvimento de programas preventivos que orientem os estudantes sobre a importância do sono na vida pessoal e social.

CONCLUSÃO

O perfil dos estudantes de enfermagem apresentou sono insatisfatório, latência do sono acima de 30 minutos e uma média de seis horas de sono no leito. Grande parte dos estudantes do último período da graduação relatou apresentar insônia. Na análise dos domínios da qualidade de vida, o domínio meio ambiente foi o pior avaliado e o domínio social foi o melhor pontuado. Os estudantes desse grupo não praticavam atividade física e apresentaram-se, segundo os valores encontrados para o IMC, sobrepeso.

Em geral, os resultados obtidos nesta pesquisa são semelhantes aos da literatura e sugerem que o sono de má qualidade em estudantes universitários é um fator de suma importância para a qualidade de vida e um indício para que as instituições educativas revejam suas políticas internas em prol da saúde e melhoria dos hábitos de vida de seus estudantes, contribuindo para o delineamento de estratégias que permitam identificar as dificuldades vivenciadas por esses estudantes no âmbito ambiental, psicológico, social e físico, favorecendo a busca por soluções para os conflitos que incidem na qualidade de vida e na qualidade do sono.

  • FOMENTO
    Esta pesquisa foi desenvolvida com apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de pessoal de Nível Superior (CAPES).

Referências bibliográficas

Editado por

  • EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
    EDITOR ASSOCIADO: Fátima Helena Espírito Santo

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    08 Maio 2019
  • Aceito
    08 Nov 2019
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