Open-access Cistadenoma mucinoso retroperitoneal primário - relato de caso

INTRODUÇÃO

O cistadenoma retroperitoneal primário é tumor muito raro, descrito por Handfield-Jones em 1924 e observado quase exclusivamente em mulheres1. A sintomatologia é geralmente inespecífica, o que dificulta o seu diagnóstico diferencial com outras massas retroperitoneais e torna os exames de imagem e a conduta cirúrgica essenciais para o diagnóstico e tratamento2.

O presente estudo relata o caso de um cistoadenoma mucinoso retroperitoneal primário benigno.

RELATO DO CASO

Mulher de 51 anos referia dor abdominal há um ano, localizada no flanco direito e irradiando para a região lombar, com piora progressiva. Ao exame físico apresentava massa palpável em flanco direito, indolor. Realizou ultrassonografia que identificou uma volumosa lesão cística abdominal. A tomografia computadorizada (Figuras 1 e 2) revelou lesão cística retroperitoneal homogênea medindo 15x12,5x5,5 cm e deslocando medialmente o cólon ascendente, sugerindo o diagnóstico de linfangioma cístico. A paciente foi submetida à laparotomia exploradora (Figuras 3 e 4), que identificou volumosa lesão cística retroperitoneal a qual foi dissecada das estruturas adjacentes com facilidade, permitindo sua ressecção completa. O pâncreas e os ovários não apresentavam alterações nem contiguidade com a lesão. Não foram observadas intercorrências durante a evolução pós-operatória. O exame anatomopatológico da peça operatória revelou cistadenoma mucinoso retroperitoneal benigno (Figuras 5 e 6).

Figura 1
Tomografia computadorizada de abdome: imagem cística de paredes regulares, sem nódulos ou vegetações murais

Figura 2
Tomografia computadorizada do abdome: volumosa lesão cística retroperitoneal ocupando flanco e fossa ilíaca direita

Figura 3
Achado intraoperatório: volumosa lesão cística retroperitoneal deslocando medialmente o cólon ascendente

Figura 4
Peça operatória: lesão cística íntegra e completamente ressecada

Figura 5
Parede do cisto (Hematoxilina e Eosina -100x)

Figura 6
Parede do cisto: células caliciformes sem invasão tecidual, caracterizando cisto benigno Hematoxilina e Eosina - 400x)

DISCUSSÃO

A maioria dos pacientes apresenta uma massa palpável assintomática ou acompanhada de dor abdominal leve que pode estar associada à queixas gastrointestinais inespecíficas2. O diagnóstico diferencial deve ser realizado com linfangioma cístico, teratoma cístico, neoplasias císticas do pâncreas e do ovário. A avaliação através de TC ou RM identifica lesão cística retroperitoneal, mas não define sua exata natureza3, de modo que a confirmação do diagnóstico só pode ser estabelecida após o exame histológico da peça operatória. Dessa forma, a conduta cirúrgica está indicada para avaliação adequada da topografia e ressecção da lesão.

Histologicamente, classifica-se o cistadenoma mucinoso retroperitoneal primário em três tipos: benigno, limítrofe e maligno4. Benigno, o mais comum, sem recidiva após a ressecção cirúrgica; limítrofe com focos de epitélio colunar proliferativo e pequeno potencial de malignidade; maligno, que pode ser recidivante e metastático5. Compartilha semelhanças histológicas com o cistadenoma mucinoso ovariano e pode localizar-se em qualquer lugar no retroperitônio, sem conexões com o ovário. A histogênese ainda permanece incompreendida; no entanto, existem duas principias hipóteses. Segundo a primeira, como há semelhança com o cistadenoma mucinoso ovariano, há a possibilidade de ele crescer a partir de um tecido ovariano ectópico6; no entanto, tecidos ovarianos foram achados na parede do cisto apenas em alguns casos7 e foram descritos casos em homens8. A segunda hipótese sugere que eles se originam a partir de uma invaginação de células mesoteliais multipotentes com subsequente metaplasia mucinosa das células mesoteliais de revestimento6.

A ressecção cirúrgica completa da lesão, além de permitir a adequada avaliação diagnóstica, também representa o melhor tratamento9.

Referências bibliográficas

  • 1 Calo PG, Congiou A, Ferreli C, Nikolosi A, Tarquin A. Primary retroperitoneal tumors. Our experience. Minerva Chirurgica 1994;49:43-9.
  • 2 Roma AA, Malpica A: Primary retroperitoneal mucinous tumors: a clinicopathologic study of 18 cases. AmJ Surg Pathol 2009;33:526-33.
  • 3 Falidas E, Konstandoudakis S, Vlachos K, Archontovasilis F, Mathioulakis S, Boutzouvis S et al. Primary retroperitoneal mucinous cystadenoma of borderline malignancy in a male patient. Case report and review of the literature. World Journal of Surgical Oncology 2011;9:98.
  • 4 Navin P, Meshkat B, McHugh S, Beegan C, Leen E, Prins H, Aly S. Primary retroperitoneal mucinous cystadenoma - A case study and review of the literature. International Journal of Surgery Case Reports 3 2012;486-488.
  • 5 Min BW, Kim JM, Um JW, Lee ES, Son GS. Kim SJ et al. The First Case of a Retroperitoenal Mucinous Cystadenoma in Korea: A Case Report. The Korean Journal of Internal Medicine 2004;19:282-284.
  • 6 Matsubara M, Shiozawa T, Tachibana R, Hondo T, Osasda K, Kawaguchi K, et al. Primary retroperitoneal mucinous cystadenoma of borderline malignancy: a case report and review of the literature. International Journal of Gynecological Pathology 2005;24:218-23.
  • 7 Pennell TC, Gusdon Jr JP. Retroperitoneal mucinous cystadenoma. American Journal of Obstetrics and Gynecology 1989;160:1229-31.
  • 8 Lai KKT, Chan YYR, Chin ACW, Ng WF, Huang YHH, Mak YLM, et al. Primary retroperitoneal mucinous cystadenoma in a 52-year-old man. Journal of Hong Kong College Of Radiologists 2004;7:223-5.
  • 9 Tapper EB, Shrewsberry AB, Oprea G, Majmudar B. A unique benign mucinous cystadenoma of the retroperitoneum: a case report and review of the literature. Archives of Gynecology and Obstetrics 2010;281:167-9.
Correspondência: Marco Aurelio Santo Filho Email: aureliosanto@uol.com.br
Conflito de interesses: não há
  • Fonte de financiamento: não há

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2014

Histórico

  • Recebido
    17 Jun 2013
  • Aceito
    13 Maio 2014
location_on
Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva Av. Brigadeiro Luiz Antonio, 278 - 6° - Salas 10 e 11, 01318-901 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (11) 3288-8174/3289-0741 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistaabcd@gmail.com
rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
Acessibilidade / Reportar erro