Open-access Efeitos dos exercícios vocais no tratamento da disfagia: revisão integrativa

RESUMO

Objetivo  verificar as evidências disponíveis sobre o efeito dos exercícios vocais no tratamento da disfagia.

Estratégia de pesquisa  foi realizado levantamento bibliográfico nas bases de dados PubMed, LILACS, SciELO e MEDLINE, sem restrições quanto ao período de publicação.

Critérios de seleção  artigos originais, estudos de caso e/ou revisões de literatura publicados nos idiomas português e/ou inglês, disponíveis eletronicamente na íntegra e que abordassem o tratamento clínico com exercícios vocais em adultos e idosos com disfagia. Foram excluídas publicações repetidas nas bases de dados, com população de crianças, com indivíduos que não apresentassem o diagnóstico de disfagia, com exercícios vocais sem especificação, com exercícios exclusivos de deglutição, artigos e/ou resumos sem possibilidade de acesso pelas plataformas institucionais e estudos com modelo animal.

Resultados  foram encontrados 2.356 artigos, dos quais, após aplicados os critérios de elegibilidade, foram selecionados 8 para a amostra final. Para avaliar os efeitos dos exercícios vocais, os estudos utilizaram avaliação clínica, videofluoroscopia, videoendoscopia e eletromiografia. Quanto aos efeitos dos exercícios vocais na deglutição, observou-se que as técnicas de som plosivo, empuxo, trato vocal semiocluído, som basal, modulação vocal, sobrearticulação, o método Lee Silverman Voice Treatment® e o uso de exercícios de treino de força muscular expiratória apresentaram efeitos positivos na reabilitação da disfagia.

Conclusão  os estudos com treino de força muscular expiratória, o método Lee Silverman e os exercícios vocais tradicionais demonstraram efeitos positivos no tratamento da disfagia. No entanto, ainda não foi possível comprovar o nível de evidências de todos os estudos.

Palavras-chave: Treinamento da Voz; Disfagia; Fonoterapia; Deglutição; Transtornos da deglutição

ABSTRACT

Purpose  To verify the available evidence on the effect of vocal exercises on the treatment of dysphagia.

Research strategy  A bibliographic survey was carried out in the PubMed, LILACS, SciELO and MEDLINE databases, with no restrictions on the publication period.

Selection criteria  Original articles, case studies and/or literature reviews published in Portuguese and/or English, available electronically in full and addressing clinical treatment with vocal exercises in adults and elderly with dysphagia. Publications repeated by the databases, with a population of children, individuals who did not present the diagnosis of dysphagia, with vocal exercises without specification, with exclusive swallowing exercises, articles and/or abstracts without the possibility of access by institutional platforms, and studies with animal model were excluded.

Results  A total of 2,356 articles were found, of which, after the eligibility criteria were applied, 08 were selected for the final sample. To evaluate the effects of vocal exercises, the studies used clinical evaluation, videofluoroscopy, videoendoscopy and electromyography. Regarding the effects of vocal exercises on swallowing, it was observed that the techniques of plosive sound, buoyancy, semi-occluded vocal tract, basal sound, vocal modulation, overarticulation, the Lee Silverman Voice Treatment method® and the use of expiratory muscle strength training exercises showed positive effects in the rehabilitation of dysphagia.

Conclusion  It was observed that studies with expiratory muscle strength training (EMST), Lee Silverman method (LSVT®) and traditional vocal exercises demonstrated positive effects in the treatment of dysphagia. However, it has not yet been possible to prove the level of evidence in all studies.

Keywords: Voice Training; Dysphagia; Speech therapy; Swallowing; Swallowing disorders

INTRODUÇÃO

A disfagia é definida como uma disfunção ou dificuldade na deglutição, durante o transporte do bolo alimentar da boca para o estômago, e pode envolver as diversas fases desse processo na presença de diferentes consistências(1). Tal disfunção pode resultar na entrada de alimento na via aérea, com consequente tosse, sufocação/asfixia e pneumonia aspirativa. De forma geral, a disfagia reflete problemas abrangendo a cavidade oral, faringe, laringe, esôfago ou transição esofagogástrica(2-4).

As estratégias utilizadas no tratamento da disfagia podem incluir, desde a conscientização e modificação da dieta até a utilização de técnicas posturais e exercícios vocais(3,5). Portanto, a adaptação do mecanismo de deglutição exige, também, mudanças em relação à força muscular, amplitude de movimento e coordenação de eventos, envolvendo as estruturas da cavidade oral, faringe e laringe e segmento faringoesofágico(3,6)

A faringe desempenha duas funções importantes: respiratória e digestiva. No ato da deglutição, a fase faríngea é influenciada pela ação dinâmica do complexo hiolaríngeo e faríngeo, atuando de forma contraída no sentido de proteção de via aérea(7). Esse complexo apresenta movimentos verticais e horizontais de estruturas que trabalham na biomecânica da deglutição(8).

Desse modo, as bases morfofuncionais dos sistemas fonatório e deglutitório estão interligadas e seu funcionamento dependente de forças mioelásticas, aerodinâmicas e pressóricas para desempenho satisfatório das funções de voz e deglutição. Estruturas da cavidade oral, orofaringe e laringe desempenham papel importante nessas funções e necessitam de atividades motoras coordenadas à respiração para maior desempenho vocal e proteção das vias aéreas inferiores, simultaneamente(7).

A literatura mostra evidências relativas à integração da fisiologia do exercício vocal e exercícios da motricidade orofaríngea utilizados no tratamento da disfagia com excelentes resultados, demonstrando melhora da ingestão oral, redução da estase em região faríngea e redução de fenda glótica, pela potencialização dos músculos e ação pressórica envolvidos no processo de deglutição(3,9,10).

Além dos exercícios vocais tradicionais e exercícios de deglutição, a técnica vocal pelo método Lee Silverman Voice Treatment (LSVT®) também tem proporcionado resultados efetivos na reabilitação de pacientes com disfagia, principalmente no controle neuromuscular de todo o trato aerodigestivo e no aumento do fluxo expiratório. Os ganhos na deglutição são atribuídos à melhora na proteção das vias aéreas inferiores (VAIs), proporcionados pelos ajustes motores para adução glótica, elevação do complexo hiolaríngeo e dinâmica pressórica do segmento faringoesofágico(11,12).

Outra abordagem utiliza exercícios respiratórios por meio do treino de força muscular expiratória (Expiratory Muscle Strength Trainer - EMST), com objetivo de ampliar a atividade elétrica dos músculos supra-hióideos, de forma a favorecer a elevação do complexo hiolaríngeo e consequente abertura da transição faringoesofágica. Esse efeito fisiológico favorece o esvaziamento de resíduos faríngeos, melhora do fechamento glótico e proteção das vias aéreas durante a deglutição(13,14).

Ademais, os dispositivos respiratórios maximizam a força de ar expiratória(14), otimizando a eficiência laríngea na produção vocal, a partir da melhora na coaptação glótica, aumento da loudness e melhora da coordenação entre os sistemas respiratório e laríngeo(13,15). Em contrapartida, quando a força muscular expiratória está reduzida, além de uma possível ineficiência da produção de voz, também pode resultar em tosse ineficaz e, consequentemente, aumentar o risco de inviabilizar a proteção de via aérea, na ocorrência de penetração de conteúdo alimentar na região glótica(13).

A utilização de técnicas vocais combinadas à terapia miofuncional é comum na reabilitação de pacientes com quadros disfágicos, promovendo a redução significativa da presença dos sinais clínicos, tais como voz molhada, deglutição múltipla, tosse, engasgo e ausculta cervical ruidosa, com melhora funcional na deglutição do alimento(1,3,6,16,17).

A reabilitação da disfagia, historicamente, concentrava-se em técnicas compensatórias, durante a função de deglutição. No entanto, esse cenário tem sido modificado, a partir da prática de exercícios de fortalecimento da musculatura envolvida nesse processo(18). A prática fonoaudiológica embasada na evidência científica exige que as pesquisas que testam as técnicas terapêuticas sejam cada vez mais controladas metodologicamente. Portanto, entender quais estudos estão sendo desenvolvidos para evidenciar os resultados das técnicas na efetividade do tratamento da disfagia é fundamental para a clínica(13,18).

O mecanismo de funcionamento do órgão laríngeo constitui importante fonte de coordenação, dinâmica da deglutição e proteção das vias aéreas inferiores(7,17) e, a melhora na elevação do complexo hiolaríngeo, associada aos ajustes musculares durante a dinâmica de adução e abdução glótica, pode resultar em importante fator de proteção das vias aéreas e reduzir as broncoaspirações em pacientes com disfagia(19).

Considerando-se, portanto a inter-relação entre a fisiologia do exercício nas clínicas de voz e disfagia(17) e o princípio da transferência do efeito de um exercício sobre mais de uma função, a partir de comandos neuromotores e dos sistemas bioquímicos e hemodinâmicos que são ativados(11), o conhecimento dos efeitos dos exercícios vocais na dinâmica da deglutição por meio de uma revisão integrativa da literatura poderá ampliar o embasamento do fonoaudiólogo na escolha das melhores técnicas para a terapia da deglutição nos pacientes disfágicos.

Adicionalmente, tal fundamentação poderá aperfeiçoar o tratamento dos pacientes que apresentam alterações vocais e da deglutição concomitantemente, ou, até mesmo, prevenir ou retardar o surgimento de sinais e sintomas vocais em pacientes disfágicos ou vice-versa, em pacientes com doenças progressivas, por exemplo.

OBJETIVO

O objetivo deste estudo foi verificar as evidências disponíveis sobre o efeito dos exercícios vocais no tratamento da disfagia, por meio de revisão integrativa.

ESTRATÉGIA DE PESQUISA

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, com caráter descritivo e qualitativo, constituído por seis fases de elaboração: 1) elaboração da pergunta norteadora; 2) busca ou amostragem na literatura; 3) coleta dos dados; 4) análise crítica dos estudos incluídos; 5) discussão dos resultados; 6) apresentação da revisão integrativa(20).

Para o levantamento de dados e discussão da pesquisa, foi formulada a pergunta norteadora: “Quais as evidências disponíveis sobre o efeito dos exercícios vocais no tratamento da disfagia?” Em seguida, foram realizadas a seleção e avaliação dos artigos, a partir da verificação de resumos relacionados ao objetivo proposto; a aplicação dos critérios de inclusão e de exclusão; a leitura completa dos artigos e análise do material, compondo o levantamento do estudo.

Como estratégia de busca, foram pesquisados artigos de periódicos científicos nas línguas portuguesa e inglesa, publicados pelas bases de dados Public Medicine Library (PubMed), Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Medical Literature Analysis and Retrievel System Online (MEDLINE), no mês de julho de 2019.

A estratégia de busca estruturada foi adaptada de acordo com o banco de dados de busca, com o objetivo de abranger o maior número possível de estudos, sendo empregados os seguintes descritores: “semioccluded vocal tract AND voice”; “voice training AND dysphagia”; “dysphagia rehabilitation AND voice”, “therapy voice AND dysphagia”; “voice training AND deglutition disorders”, extraídos do Medical Subject Headings (MeSH) e dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), conforme apresentado no Quadro 1.

Quadro 1
Descritores consultados segundo as bases de dados

CRITÉRIOS DE SELEÇÃO

Os critérios de inclusão foram definidos em artigos originais, estudos de caso e/ou revisões de literatura publicados nos idiomas português e/ou inglês, disponíveis eletronicamente na íntegra para leitura, e que abordassem o tratamento clínico com exercícios vocais em adultos e idosos com disfagia. Os critérios de exclusão foram publicações repetidas nas bases de dados, com população de crianças, com indivíduos sem disfagia, exercícios vocais sem especificação, com exercícios exclusivos de deglutição, artigos e/ou resumos sem acesso livre/gratuito e estudos com modelo animal.

Os artigos foram analisados por meio da estratégia PCC, em que P corresponde à população (adultos e idosos), C corresponde ao conceito (exercícios vocais) e o segundo C corresponde ao contexto (tratamento das disfagias).

ANÁLISE DOS DADOS

Todos os textos selecionados foram analisados por dois avaliadores independentemente e, quando havia discordância entre eles, um terceiro avaliador participava da análise para definição dos artigos. Os itens considerados na análise foram: casuística (com idade e gênero dos participantes e distúrbio de base), objetivo do estudo, delineamento do estudo, técnicas utilizadas, principais resultados e conclusão.

Foram obtidos 2.356 artigos para leitura de resumos e, destes, excluídos 2.326, por não atenderem aos critérios de elegibilidade do estudo.

Trinta artigos foram selecionados para leitura na íntegra. Dentre eles, 22 foram excluídos por não atenderem aos critérios de elegibilidade do estudo. Oito artigos atenderam aos critérios e foram selecionados para análise do conteúdo, conforme apresentado no fluxograma (Figura 1).

Figura 1
Fluxograma do processo de seleção dos artigos

RESULTADOS

Foram identificados 2.356 estudos na busca inicial, sendo 2.326 excluídos após a leitura de títulos e resumos. Foram lidos, na íntegra, 30 artigos, conforme as etapas de seleção descritas (Figura 1). Por fim, a amostra final desta revisão foi constituída por 8 artigos científicos, selecionados pelos critérios de inclusão previamente estabelecidos. Destes, 5 foram encontrados na base de dados PubMed e 3, na SciELO.

Após a análise de todos os estudos incluídos na revisão integrativa, verificou-se ocorrência de 3 estudos experimentais(3,11,12), sendo um ensaio clínico randomizado (nível de evidência 2)(3) e 2 não randomizados (nível de evidência 3)(11,12), 3 estudos de revisão(13,14,21), sendo uma sistemática (nível de evidência 1)(13) e 2 narrativas(14,21) e 2 estudos de casos (nível de evidência 5)(9,10), de acordo com a classificação utilizada(22). Os estudos incluídos foram produzidos entre os anos de 2002 e 2019.

A síntese dos 8 artigos incluídos no estudo, segundo autor, ano da publicação, título do artigo, casuística, objetivo do estudo, delineamento do estudo, técnicas utilizadas, principais resultados e conclusão está descrita no Quadro 2.

Quadro 2
Síntese dos oito artigos examinados

Verificou-se que, em 6 artigos(3,9,10,12,21), as técnicas vocais contribuíram para melhora da deglutição em pacientes disfágicos e 3(12-14) apontaram melhora no fluxo expiratório e/ou diminuição da tosse, após a realização de exercícios vocais.

De acordo com os resultados da pesquisa sobre os exercícios vocais no tratamento da disfagia, 2 estudos(13,14) retrataram o exercício de treino de força muscular expiratória, 3 estudos(11,12,21) abordaram o método Lee Silverman Voice Treatment ou LSTV/LOUD e 3 estudos(3,9,10) apontaram resultados com exercícios vocais tradicionais.

Nesse contexto, pode-se destacar que, de acordo com a literatura consultada, os exercícios de treino de força muscular expiratória (Expiratory Muscle Strength Training - EMST) o método Lee Silverman Voice Treatment -LSTV® e os exercícios vocais tradicionais foram as técnicas mais relevantes na reabilitação de indivíduos com disfagia(23).

Metade dos estudos avaliados foi com pacientes diagnosticados com doença de Parkinson, com queixas relacionadas a distúrbios vocais e distúrbios de deglutição(9,10,12,18). Do total de artigos, 3 foram revisões de literatura(13,14,21).

Em comparação às técnicas aplicadas, o método LSVT® apresentou efeitos no controle neuromuscular do trato aerodigestivo superior e na eficácia da tosse involuntária(11,12,21). O EMST obteve resultados na proteção de vias aéreas(13,14) e os exercícios vocais tradicionais resultaram em melhora na ingestão oral(3,9,10) e, quando associados aos exercícios miofuncionais, melhoraram força, tônus e mobilidade de língua, na ejeção do alimento e redução de resíduos orais e faríngeos(9).

DISCUSSÃO

Os exercícios de treino de força muscular expiratória, a despeito de não serem exercícios de função fonatória, propriamente dita, foram considerados neste estudo por fazerem parte, também, da clínica vocal(14,15).

Neste estudo, os dois artigos que consideraram o EMST no tratamento da deglutição foram artigos de revisão, sendo uma narrativa(14) e a outra, sistemática(13). Na revisão narrativa, os estudos citados demonstraram resultados promissores do EMST na prática terapêutica nos casos de disfonia e disfagia, apontando-o como um treinamento não específico para a proteção das vias aéreas em pessoas com alterações neuromusculares. Porém, os autores admitem que são necessários estudos mais controlados para confirmar e generalizar as descobertas relatadas(14), concordando com outra revisão sistemática sobre tratamento para disfagia em pacientes com doença de Parkinson(24).

Vele destacar que a terapia com EMST, na função de deglutição, revelou-se como potencialmente simples e econômica para reduzir a penetração-aspiração em pacientes com doença de Parkinson, evidenciando aumento substancial na elevação e excursão do complexo hiolaríngeo durante a deglutição, após o tratamento(19,25).

O EMST é realizado com dispositivo respiratório, que atua como um incentivador respiratório, cujo objetivo é exercitar os músculos supra-hióideos e, com isso, melhorar a elevação do complexo hiolaríngeo. Há excelentes evidências publicadas com estudo videofluoroscópico (padrão ouro na avaliação da deglutição). A melhora na mobilidade e na função do complexo hiolaríngeo promove a elevação e anteriorização laríngea, favorecendo diretamente a abertura do segmento faringolaríngeo por ação mecânica. Isso reflete na redução de resíduos na faringe e na transição faringoesofágica(19,25), constatando maior proteção de vias aéreas durante a deglutição e redução no risco de penetração/aspiração na reabilitação da disfagia em pacientes com Parkinson(19).

Tais estudos concordam com os resultados do artigo de revisão sistemática que enfatiza que o fonoaudiólogo pode usar o treino de força muscular expiratória (EMST) na prática clínica, pois a utilização desse exercício atua na proteção e segurança das vias aéreas em adultos com disfagia(13).

Os incentivadores respiratórios são úteis no auxílio da reexpansão pulmonar, no aumento da permeabilidade das vias aéreas e no fortalecimento de músculos respiratórios. O uso desses aparelhos, associados à sucção ou sopro, interfere na mobilidade do véu palatino, do complexo hiolaríngeo e no trânsito faríngeo(26).

Ademais, a despeito de não se aplicar a todos os casos, a fonoterapia com instrumento de sopro é capaz de proporcionar maior eficiência na adução glótica e controle respiratório, propiciando melhora na qualidade vocal, maior estabilidade fonatória e aumento de intensidade vocal(27). Pode ser recomendada como medida preventiva para diminuir o efeito da sarcopenia nos músculos usados ​​na deglutição e voz e alterar a progressão das características da senescência na voz e deglutição(28).

No presente estudo, o único artigo de revisão sistemática sobre os efeitos do EMST nas funções de deglutição e voz reconheceu a necessidade de mais estudos de ensaios clínicos randomizados com essa técnica, para resultados mais robustos. Entretanto, os autores afirmam que há evidências preliminares de que essa técnica pode melhorar os resultados da função da deglutição em indivíduos com disfagia, acometidos por doença de Parkinson ou acidente vascular cerebral e que a técnica também pode beneficiar deficiências no tratamento de indivíduos com alterações na comunicação de base motora(13).

O método LSVT® (ou LSVT LOUD®) é um programa desenvolvido por fonoaudiólogos americanos para o tratamento de alterações de fala e voz em pacientes com doença de Parkinson. Cada sessão dura, em média, uma hora, totalizando quatro sessões semanais, durante um mês. A terapia é dividida em duas partes: tarefas diárias e fala hierárquica(11,21).

O objetivo nas tarefas diárias é aumentar a intensidade vocal com repetições variadas da vogal sustentada /a/, com variações tonais, variações de tempo de emissão e de repetições, além de frases funcionais escolhidas pelos pacientes. Na fala hierárquica, os pacientes progridem com a produção do discurso (palavras, frases e conversação) para treinar a intensidade vocal adquirida e melhorar a fala funcional, pois favorece a excursão laríngea, o alongamento das pregas vocais, podendo impactar positivamente a prosódia desses pacientes(3,11,12,18,21,23,29).

Na amostra do presente estudo, verificou-se que as mudanças fisiológicas na reabilitação da fala com o LSVT®, em pacientes com doença de Parkinson, foram capazes de desencadear transformações na sinergia e atividade da musculatura supraglótica e laríngea, melhorando, também, a deglutição desses pacientes, sendo notável a redução do tempo de trânsito oral durante a fase faríngea e diminuição de resíduo oral e faríngeo, reduzindo o risco de aspiração pós-deglutição e promovendo a eficiência na deglutição orofaríngea, além de melhora do fluxo expiratório e da tosse involuntária(11,12,21)

Os efeitos positivos do LSVT/LOUD® foram documentados em outros distúrbios, além da doença de Parkinson, como no acidente vascular encefálico e na paralisia cerebral. Os resultados dessa técnica, na deglutição, evidenciaram que houve redução de 51% no número de disfagia orofaríngea severa para líquidos e sólidos. Os achados indicaram que o tratamento se estende à musculatura do trato aerodigestivo, mesmo quando o foco é laringorespiratório(21).

Tais resultados concordam com os de outro estudo com o LSVT®, que apontou o favorecimento da técnica na ativação dos músculos orofaríngeos, laríngeos e na elevação glótica(18). Esse efeito fisiológico contribui diretamente para a melhora da ejeção oral do alimento, redução no tempo de trânsito oral, adução glótica e abertura da transição faringoesofágica, de forma a favorecer a proteção das vias aéreas inferiores, eliminação dos resíduos faríngeos e risco de penetração laringotraqueal(11,12,18,21).

Quanto à aplicação dos exercícios vocais (som plosivo, empuxo, trato vocal semiocluído com firmeza glótica ou som vibrante, tempo máximo de fonação e vocal fry), combinados com exercícios miofuncionais (isotônicos, isométricos e de contrarresistência de lábios, língua e bochechas), em pacientes com disfagia orofaríngea, observou-se que foi mais eficaz nos níveis de ingestão oral avaliados pela escala Functional oral intake scale (FOIS), do que os exercícios miofuncionais isolados(3).

A escala FOIS é utilizada para avaliar a capacidade de ingestão oral, que pode ser atribuída após avaliação clínica com protocolo padronizado validado. Em estudo-piloto(3), a FOIS serviu como marcador para mensurar a eficácia da reabilitação em disfagia orofaríngea(3,5).

Os exercícios vocais em escalas (com modulação vocal) e os exercícios miofuncionais (exercícios isométricos de base da língua) aplicados na reabilitação da disfagia também promoveram melhora progressiva da sensação de estase do alimento na faringe e no desempenho geral da deglutição(10).

Além disso, foi observada melhora na redução da fenda glótica, nos aspectos funcionais de força, tônus e mobilidade de língua, redução do escape alimentar e aumento no padrão do sopro, após a realização de exercícios miofuncionais (isotônico e isométricos de língua) e emissão da vogal sustentada / i / com mãos em forma de gancho, associadas à flexão do pescoço(9).

Tais achados comprovam que a intervenção fonoaudiológica com exercícios vocais promove melhora na deglutição e na qualidade de vida em deglutição, conforme estudo com pacientes com paralisia de prega vocal. Os parâmetros alterados na avaliação pré-fonoterapia obtiveram melhora, quando comparados na avaliação pós-fonoterapia, inferindo que as compensações feitas foram eficientes nos aspectos vocais e de deglutição(30).

O presente estudo pôde demonstrar, portanto, os benefícios de exercícios utilizados na terapia vocal para os quadros disfágicos e os resultados podem embasar a terapia para disfagia, principalmente no atendimento de pacientes com alterações vocais associadas.

Há que se considerar, porém, que este estudo apresentou algumas limitações relativas à metodologia proposta, pois não avaliou a qualidade dos estudos incluídos, sofreu a restrição de considerar os artigos disponíveis de forma gratuita (nas plataformas institucionais) e não foram incluídas, na estratégia de busca, as tecnologias aplicadas ao tratamento da voz, como a estimulação elétrica neuromuscular ou a fotobiomodulação. Dessa forma, pode-se concluir que as chaves de busca e os descritores podem ter limitado a seleção dos artigos. Quanto às limitações dos estudos selecionados nesta pesquisa, considera-se que são relativas à qualidade da evidência.

Sugere-se, para estudos futuros, a ampliação do escopo da pesquisa em outras populações, a exemplo de idosos e pacientes oncológicos e realização de estudos randomizados e controlados nessa temática, para aprimoramento da evidência científica.

CONCLUSÃO

Os estudos com treino de força muscular expiratória (EMST), método Lee Silverman (LSVT®) e exercícios vocais tradicionais, associados à terapia miofuncional, demonstraram efeitos positivos na reabilitação da disfagia, sendo utilizadas, como parâmetro, as avaliações clínicas pré e pós-fonoterapia e os exames de videofluoroscopia, videoendoscopia e eletromiografia. No entanto, não foi possível comprovar o nível de evidências de todos os estudos.

  • Trabalho realizado na Universidade Federal de Pernambuco – UFPE – Recife (PE), Brasil.
  • Financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - código de financiamento 001 e Pró-Reitoria de Pós-Graduação da Universidade Federal de Pernambuco (PROPG-UFPE).

REFERÊNCIAS

  • 1 Gutiérrez Achury AM, Ruales Suárez K, Giraldo Cadavid LF, Rengifo Varona ML. Escalas de calidad de vida y valoración de los síntomas en disfagia. Rev Fac Med (Caracas). 2015;23(1):50-5. http://dx.doi.org/10.18359/rmed.1329
    » http://dx.doi.org/10.18359/rmed.1329
  • 2 Padovani AR, Moraes DP, Mangili LD, Andrade CRF. Protocolo fonoaudiológico de avaliação do risco para disfagia (PARD). Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(3):199-205. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342007000300007
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342007000300007
  • 3 Fraga BF, Almeida ST, Santana MG, Cassol M. Efficacy of myofunctional therapy associated with voice therapy in the rehabilitation of neurogenic oropharyngeal dysphagia: a pilot study. Int Arch Otorhinolaryngol. 2018;22(3):225-30. http://dx.doi.org/10.1055/s-0037-1605597 PMid:29983759.
    » http://dx.doi.org/10.1055/s-0037-1605597
  • 4 Inaoka C, Albuquerque C. Efetividade da intervenção fonoaudiológica na progressão da alimentação via oral em pacientes com disfagia orofaríngea pós AVE. Rev CEFAC. 2014;16(1):187-96. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201413112
    » http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201413112
  • 5 Furkim AM, Sacco ABF. Eficácia da fonoterapia em disfagia neurogênica usando a escala funcional de ingestão por via oral (FOIS) como marcador. Rev CEFAC. 2008;10(4):503-12. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462008000400010
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462008000400010
  • 6 Luchesi KF, Kitamura S, Mourão LF. Progressão e tratamento da disfagia na doença de Parkinson: estudo observacional. Braz J otorrinolaringol. 2015;81:24-30.
  • 7 Costa MMB. Deglutição e disfagia: bases morfofuncionais e videofluoroscópicas. Rio de janeiro: Editora Medbook; 2013.
  • 8 Steele CM, Miller AJ. Sensory input pathways and mechanisms in swallowing: a review. Dysphagia. 2010;25(4):323-33. http://dx.doi.org/10.1007/s00455-010-9301-5 PMid:20814803.
    » http://dx.doi.org/10.1007/s00455-010-9301-5
  • 9 Maffei C, Gonçalves MI, de Mello MM, Kluppel J Jr, Camargo PA. Pharyngeal cervical neurinoma: dysphonia and dysphagia. Braz J Otorhinolaryngol. 2007 Out;73(5):718. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-72992007000500021 PMid:18094817.
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0034-72992007000500021
  • 10 Rodrigues KA, Menezes FT, Nerto ICO, Lederman HM, Manrique D, Chiari BM. Dysphagia associated to psychogenic dysphonia: case report. Distúrb Comun. 2012;24(3):415-20.
  • 11 El Sharkawi A, Ramig L, Logemann JA, Pauloski BR, Rademaker AW, Smith CH, et al. Swallowing and voice effects of Lee Silverman Voice Treatment (LSVT®): a pilot study. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2002;72(1):31-6. http://dx.doi.org/10.1136/jnnp.72.1.31 PMid:11784821.
    » http://dx.doi.org/10.1136/jnnp.72.1.31
  • 12 Miles A, Jardine M, Johnston F, de Lisle M, Friary P, Allen J. Effect of Lee Silverman Voice Treatment (LSVT LOUD®) on swallowing and cough in Parkinson’s disease: a pilot study. J Neurol Sci. 2017;383(15):180-7. http://dx.doi.org/10.1016/j.jns.2017.11.015 PMid:29246611.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.jns.2017.11.015
  • 13 Brooks M, McLaughlin E, Shields N. Expiratory muscle strength training improves swallowing and respiratory outcomes in people with dysphagia: a systematic review. Int J Speech Lang Pathol. 2019;21(1):89-100. http://dx.doi.org/10.1080/17549507.2017.1387285 PMid:29090601.
    » http://dx.doi.org/10.1080/17549507.2017.1387285
  • 14 Laciuga H, Rosenbek JC, Davenport PW, Sapienza CM. Functional outcomes associated with expiratory muscle strength training: narrative review. 2014;51(4):535-46.
  • 15 Tsai YC, Huang S, Che W, Huang Y, Liou T, Kuo Y. The effects of expiratory muscle strength training on voice and associated factors in medical professionals with voice disorders. J Voice. 2016;30(6):759.e21-7. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2015.09.012 PMid:26564581.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2015.09.012
  • 16 Alves ICF, Andrade CLF. Functional change in the pattern of swallowing through the performance of orofacial exercises. CoDAS. 2017;29(3):e20160088. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20172016088 PMid:28538826.
    » http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20172016088
  • 17 Rehder MI, Branco AA. organizadores. Disfonia e disfagia – interface, atualização e prática clínica. Rio de Janeiro: Revinter; 2011. 224 p.
  • 18 Burkhead LM, Sapienza CM, Rosenbek JC. Strength-Training Exercise in dysphagia rehabilitation: principles, procedures, and directions for future research. Dysphagia. 2007;22(3):251-65. http://dx.doi.org/10.1007/s00455-006-9074-z PMid:17457549.
    » http://dx.doi.org/10.1007/s00455-006-9074-z
  • 19 Troche MS, Okun MS, Rosenbek JC, Musson N, Fernandez HH, Rodriguez R, et al. Aspiration and swallowing in parkinson disease and rehabilitation with EMST – a randomized trial. Neurology. 2010;75(21):1912-9. http://dx.doi.org/10.1212/WNL.0b013e3181fef115
    » http://dx.doi.org/10.1212/WNL.0b013e3181fef115
  • 20 Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Integrative review: what is it? How to do it? Einstein (Sao Paulo). 2010 Mar;8(1):102-6. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010rw1134 PMid:26761761.
    » http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010rw1134
  • 21 Fox CM, Ramig LO, Ciucci MR, Sapir S, McFarland DH, Farley BG. The science and practice of LSVT/LOUD: neural plasticity-principled approach to treating individuals with Parkinson disease and other neurological disorders. Semin Speech Lange. 2006;27(4):283-99.
  • 22 Murad MH, Asi N, Alsawas M, Alahdab F. New evidence pyramid. Evid Based Med. 2016;21(4):125-7. http://dx.doi.org/10.1136/ebmed-2016-110401 PMid:27339128.
    » http://dx.doi.org/10.1136/ebmed-2016-110401
  • 23 Dias AE, Chien HF, Barbosa ER. O método Lee Silverman para reabilitação da fala na doença de Parkinson. Rev Neurocienc. 2011;19(3):551-7. http://dx.doi.org/10.34024/rnc.2011.v19.8356
    » http://dx.doi.org/10.34024/rnc.2011.v19.8356
  • 24 van Hooren MR, Baijens LW, Voskuilen S, Oosterloo M, Kremer B. Treatment effects for dysphagia in Parkinson’s disease: a systematic review. Parkinsonism Relat Disord. 2014;20(8):800-7. http://dx.doi.org/10.1016/j.parkreldis.2014.03.026 PMid:24794097.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.parkreldis.2014.03.026
  • 25 Wheeler-Hegland KM, Rosenbek JC, Sapienza CM. Submental sEMG and hyoid movement during mendelsohn maneuver, effortful swallow, and expiratory muscle strength training. J Speech Lang Hear Res. 2008;51(5):1072-87. http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2008/07-0016) PMid:18728114.
    » http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2008/07-0016)
  • 26 Machado JRS, Steidl EMS, Bilheri DFD, Trindade M, Weis GL, Jesus PRO, et al. Efeitos do exercício muscular respiratório na biomecânica da deglutição de indivíduos normais. Rev CEFAC. 2015;17(6):1909-15. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517621514
    » http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517621514
  • 27 Rosa JC, Cielo CA, Cechella C. Função fonatória em pacientes com doença de Parkinson: uso de instrumento de sopro. Rev CEFAC. 2009;11(2):305-13. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009000200016
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009000200016
  • 28 Silva GS, Jorge AG, Peres FM, Cola PC, Gatto AR, Spadotto AA. Protocolo para controle de eficácia terapêutica em disfagia orofaríngea neurogênica (PROCEDON). Rev CEFAC. 2010;12(1):75-81. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462010000100010
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462010000100010
  • 29 Sapir S, Ramig L, Fox C. Speech and swallowing disorders in Parkinson disease. Curr Opin Otolaryngol Head Neck Surg. 2008;16(3):205-10. http://dx.doi.org/10.1097/MOO.0b013e3282febd3a PMid:18475072.
    » http://dx.doi.org/10.1097/MOO.0b013e3282febd3a
  • 30 Mangilli LD, Amoroso MRM, Nishimoto IN, Barros APB, Carrara-de-Angelis E. Voz, deglutição e qualidade de vida de pacientes com alteração de mobilidade de prega vocal unilateral pré e pós-fonoterapia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2008;13(2):103-12. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342008000200003
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342008000200003

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    30 Jul 2021
  • Aceito
    01 Nov 2021
location_on
Academia Brasileira de Audiologia Rua Itapeva, 202, conjunto 61, CEP 01332-000, Tel.: (11) 3253-8711 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@audiologiabrasil.org.br
rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
Acessibilidade / Reportar erro