CONGRESSOS MÉDICOS
O primeiro tema, "Métodos de objetivação na investigação científica", relatado por Willy Baranger (Montevidéu, Uruguai) e por Ignácio Matte Blanco (Santiago, Chile), tendo como coordenador Isaías Melsohn (São Paulo), mereceu discussão acalorada, resultando a conclusão que a Psicanálise é uma ciência que tem seus próprios métodos, concepções e técnicas; quaisquer tentativas que visem buscar confirmação ou apôio em outras ciências ou métodos científicos levam a resultados precários. A validade da Psicanálise só pode ser encontrada no trabalho clínico, usando os conceitos e os métodos recomendados por Freud.
O segundo tema, "Desenvolvimento primitivo do indivíduo", relatado por Ismael Walderedo de Oliveira (Rio de Janeiro) e Arnaldo Rascovsky (Buenos Aires, Argentina), foi abordado com perspectivas originais. O primeiro dos relatores expôs as concepções sôbre a vida psíquica da criança desde que ela nasce até adquirir certo desenvolvimento, assinalando as freqüentes possibilidades de distorção e repressão na vida emocional, que permitem compreender a patologia das neuroses, psicoses e psicopatias, de acôrdo com o que se observa diàriamente no trabalho clínico. O segundo foi além e mostrou inúmeros fatos que permitem conceber a existência de uma vida psíquica rudimentar e sui generis ainda no período intra-uterino da vida da criança. Tais concepções facilitam a interpretação de muitos aspectos do comportamento dos neuróticos, psicóticos e psicopatas. Trata-se de considerar a realidade interna da vida da criança que sòmente pode ser apreciada e compreendida graças à técnica psicanalítica e que nem sempre corresponde ao seu comportamento segundo a observação direta, isto é, através da observação pelo prisma da realidade externa. De certa forma podemos falar de uma "criança psicanalítica", apreciada e concebida sob o prisma da psicanálise.
Para o terceiro tema, "Técnica Psicanalítica", houve dois relatores. O primeiro, Enrique Racker (Buenos Aires, Argentina), procurou estabelecer uma aproximação entre a técnica chamada clássica e a técnica moderna ou kleiniana, não conseguindo, apesar de sua cultura, experiência clínica e grande zêlo na elaboração do relatório, desfazer algumas diferenças técnicas que, segundo nosso modo de ver, são radicais. Isto ficou patente na exposição que fêz o segundo relator, Décio de Souza (Rio de Janeiro), que insistiu nas diferenças de técnica, mostrando quanto a concepção kleiniana permite tornar mais vivas e ativas as sessões analíticas. Nem por isso, todavia, se consegue encurtar a duração do tratamento analítico. Aqui se estabelece um verdadeiro paradoxo: quanto mais conhecemos as origens e desenvolvimento das emoções e aperfeiçoamos a técnica para atingi-las, mais longas se tornam as análises. Parece estar vaticinado que quanto mais e melhor trabalhamos com a vida psíquica dos nossos pacientes e com a nossa própria, mais profundamente e mais demoradamente precisamos trabalhar.
O quarto tema, "Ensino de Psicanálise", confirmou o que já havia sido acentuado no dia anterior com respeito à "Técnica Psicanalítica". De fato, os relatores do último tema - Werner Kemper (Rio de Janeiro), Adelheid Koch (São Paulo), Arminda Pichon Riviére (Buenos Aires, Argentina) e Sacha Nacht (Paris, França), tendo o relatório dêste último sido feito em colaboração com Lebovici e R. Diatkine - mostraram como, à proporção que conhecemos a vida psíquica por via psicanalítica, mais o ensino é complexo e demorado. Os relatores analisaram vários problemas, tais como a seleção dos candidatos a psicanalista, a cultura prévia indispensável para o exercício da profissão, a duração da análise pessoal (didática), a necessidade de supervisão com dois ou mais analistas encarregados de preparar o analista que inicia suas atividades e, finalmente, as relações entre os professôres e entre os analistas e seus professôres. Foi um dos temas mais substanciosos, sendo tratado com o maior carinho. Os relatores reconhecem que os candidatos que não têm aptidão para serem psicanalistas devem ser desde logo advertidos de suas dificuldades, a fim de que não desperdicem tempo e dinheiro em uma preparação que não lhes será favorável; considera-se como sucesso o fato de um candidato adquirir consciência, durante a análise didática, de que suas tendências têm outros objetivos. É claro que seria preferível que todo o candidato se revelasse um talento para o exercício da psicanálise como profissional. Como isso não é possível, recomendam os relatores que todo o empenho deve ser aplicado na preparação dos psicanalistas, ajudando-os a vencer suas dificuldades e auxiliando-os a apurar suas aptidões naturais. Isso, evidentemente, não é fácil; por isso mesmo a tarefa deve ser enfrentada com os cuidados recomendados pelos relatores.
Deve ser assinalada a presença de especialistas convidados, alguns dos quais fizeram ilustrativas conferências: William Gillespie (Londres), presidente da Associação Psicanalítica Internacional, discorreu sôbre Homossexualismo; Paula Heimann (Londres) dissertou sôbre o Desenvolvimento primitivo do indivíduo; Mellita Sperling (Nova York) apresentou o relatório referente a um paciente com ileíte crônica localizada, tratado e curado pela psicanálise. As concepções e técnicas mencionadas pelos conferencistas despertaram grande interesse.
O comparecimento de especialistas de língua inglêsa visou a auscultar quanto a possibilidade de, futuramente, transformar o Congresso Latino-Americano em Pan-Americano. Entretanto, na sessão administrativa final prevaleceu a opinião de que o congresso deveria continuar sendo Latino-Americano. Os próprios conferencistas de língua inglêsa reconheceram que a América Latina tem características próprias, originais, que devem ser desenvolvidas e melhor conhecidas.
A sessão administrativa realizou-se com a presença exclusiva dos membros titulares das várias sociedades latino-americanas de Psicanálise que aderiram e prestigiaram o certame, sendo decidido que o próximo congresso seria realizado em Santiago (Chile), aproximadamente em janeiro de 1960; os temas selecionados por votação, entre vários propostos, foram os seguintes: 1. Relações entre os analistas; 2. Investigações e problemas atuais da psicanálise dos sonhos; 3. Aplicações sociais e difusão da Psicanálise.
Foi decidida, também, a organização de uma "Comissão coordenadora das atividades psicanalíticas latino-americanas" que cuidará da manutenção de uma Revista de Psicanálise e da planificação das atividades psicanalíticas na América Latina.
Mário Yahn
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
11 Dez 2013 -
Data do Fascículo
Mar 1959