RESUMO
O autor descreve o caso de uma paciente que apresenta o olho direito com o sulco palpebral profundo e enoftalmia deste lado, tratado durante uma década com Bimatoprost tópica. Concluem que os achados clínicos são provavelmente efeitos colaterais do medicamento.
Descritores: Glaucoma/quimioterapia; Soluções oftálmicas/efeitos adversos; Bimatoprost tópico; Enoftalmia/induzido quimicamente; Relato de casos
ABSTRACT
The author describes a case report of a patient with unilateral enophthalmia and deep palpebral sulcus probably induced by the topical use of Bimatoprost on the side of the collateral effects described.
Keywords: Glaucoma/drug therapy; Ophthalmic solutions/adverse effects; Ophthalmic solutions/therapeutic use; Enophtlalmos/ chemically induced; Case reports
INTRODUÇÃO
studos clínicos e experimentais recentemente mostraram a associação de aprofundamento do sulco palpebral superior e enoftalmia como efeito colateral do uso tópico de Bimatoprost e os análogos de prostaglandinas. A causa provável seria uma apoptose dos adipócitos induzidos pelo colírio(1-4).
Apresentamos o caso de uma mulher de 80 anos que faz uso de Bimatoprost tópico uma vez ao dia por 9 anos, apenas no olho direito, e que desenvolveu uma assimetria entre os olhos por um aprofundamento do sulco palpebral superior e uma leve enoftalmia do lado em tratamento associado ao crescimento unilateral dos cílios e leve hiperpigmentacao da íris do mesmo lado da enoftalmia.
RELATO DE CASO
Paciente (LJAA) do sexo feminino, com 61 anos à época, foi submetida à facectomia com implante de lente intraocular bilateral no olho direito em 1994 e no olho esquerdo em 1997.A anestesia para os dois procedimentos de facoemulsificação foi a injeção peribulbar de 5 ml de Marcaína a 0,75% com Hialozima 500 UTR. A acuidade visual pós-operatória atualmente é de 20/40 e 20/30 com correção no olho direito e esquerdo, respectivamente. O olho direito evoluiu com pequena complicação e captura parcial da lente dois meses após a intervenção apresentando uma leve discoria associado a glaucoma secundário leve que se manifestou em 1997. Este foi controlado com o uso tópico de Timolol 0,5% e dorzolamida duas vezes ao dia somente no lado direito com glaucoma secundário. Em 2002, o tratamento do glaucoma secundário do olho direito foi modificado para Bimatoprost uma vez ao dia com controle adequado do glaucoma simetrizando a PIO em 15mm em AO.Após dois anos se cogitou interromper o tratamento com Bimatoprost devido ao crescimento dos cílios apenas do olho direito que ficou evidente na comparação com o lado normal. A paciente preferiu continuar com o mesmo colírio já que este efeito colateral não a incomodava. Oito anos após foi possível notar uma diferença na estética entre os dois olhos já que o olho direito apresentava a íris mais escura e com o sulco palpebral mais profundo que o esquerdo e logo percebeu-se uma enoftalmia do lado direito. A exoftalmometria média de 13 e 16 mm respectivamente (OD e OE), portanto o olho direito estava 03 milímetros mais profundo que o olho esquerdo. A figura 1 mostra a paciente há 20 anos, antes das cirurgias de catarata, com o sulco palpebral mais acentuado do lado esquerdo, provavelmente devido ao fato de sua órbita esquerda ser ligeiramente maior que a direita, evidenciado na tomografia computadorizada (figura 2). Nas figuras 3, 4 e 5 percebe-se a assimetria atual com o aprofundamento do sulco palpebral direito, enoftalmia com aumento do tamanho dos cílios e escurecimento da íris do lado direito, lado do uso tópico do Bimatoprost.A tomografia computadorizada axial (figura 5) mostra a enoftalmia do lado direito.A ultrassonografia diagnóstica de ambos os olhos e órbitas foi normal e a ecobiometria demonstrou que ambos têm o mesmo comprimento axial (22,60 mm OD e 22,09 mm OE), mostrando que a assimetria do sulco não era provocada por diferença no tamanho dos olhos.
Paciente fotografada há 15 anos (antes do uso de Bimatoprost) com sulco palpebral do olho esquerdo mais profundo que o direito devido à órbita ser ligeiramente maior, como pode ser visto na tomografia computadorizada no corte coronal abaixo
Foto atual; olho direito em uso de Bimatorprost com cílios mais compridos e presença da enoftalmia
Foto atual mostrando o sulco palpebral mais profundo à direita e íris ligeiramente mais escura no olho direito
Leve enoftalmia (3 mm) do olho direito em relação ao esquerdo; ambos os olhos têm o mesmo diâmetro
DISCUSSÃO
A enoftalmia causada por provável atrofia de adipócitos orbitários é uma das complicações recentemente descritas pelo uso de análogos de prostaglandinas para o tratamento do glaucoma. Esta foi observada na clínica e experimentalmente(1-4). Esta enoftalmia se desenvolve lentamente e é difícil perceber que algo está mudando neste sentido devido à lentidão com que esta mudança ocorre e principalmente quando o tratamento com a mesma droga é bilateral e as alterações são simétricas. O uso desta droga no olho de um lado apenas provoca uma mudança gradual de simetria que chama a atenção devido ao aprofundamento do sulco palpebral no lado do uso do colírio. Esta mudança acrescida do crescimento dos cílios e da pigmentação da íris torna a assimetria mais fácil de ser percebida. Nossa paciente apresentava em uma foto antiga um sulco palpebral mais profundo do lado esquerdo devido à órbita maior deste lado (figuras 1 e 2). Para provocar a assimetria do sulco, a atrofia da gordura do lado direito precisou ficar mais acentuada para primeiro equilibrar o aspecto do sulco entre os dois olhos e somente depois ficar mais acentuado do lado direito em relação ao lado esquerdo, processo este que levou alguns anos como foi descrito (figuras 3, 4 e 5). Conforme podemos observar na figura 5 a única diferença que poderia ser responsabilizada por esta enoftalmia é uma menor quantidade de gordura deste lado, tendo em vista que as outras estruturas orbitárias apresentam o volume semelhante entre as duas órbitas. O ato operatório provavelmente não tem relação com estas alterações porque os procedimentos foram iguais em ambos os lados e realizados pelos mesmos profissionais.
Concluímos que a Bimatoprost pode estar associada à enoftalmia e ao aprofundamento do sulco palpebral em olhos tratados com o uso crônico do medicamento e que os usuários desta droga devem ser alertados sobre este efeito colateral ao iniciar o tratamento.
AGRADECIMENTOS
O autor agradece a colaboração e anuência da paciente descrita para a publicação deste caso.
REFERÊNCIAS
- 1 Tappeiner C, Perren B, Iliev ME, Frueh BE, Goldblum D. [Orbital fat atrophy in glaucoma patients treated with topical bimatoprost - can bimatoprost cause enophthalmos?]. Klin Monbl Augenheilkd. 2008;225(5):443-5. German.
- 2 Filippopoulos T, Paula JS, Torun N, Hatton MP, Pasquale LR, Grosskreutz CL. Periorbital changes associated with topical bimatoprost. Ophthal Plast Reconstr Surg. 2008;24(4):302-7.
- 3 Aydin S, Iþýklýgil I, Tekºen YA, Kir E. Recovery of orbital fat pad prolapsus and deepening of the lid sulcus from topical bimatoprost therapy: 2 case reports and review of the literature. Cutan Ocul Toxicol. 2010;29(3):212-6.
- 4 Jayaprakasam A, Ghazi-Nouri S. Periorbital fat atrophy - an unfamiliar side effect of prostaglandin analogues. Orbit. 2010;29(6):357-9.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Jan-Feb 2016
Histórico
-
Recebido
13 Jul 2012 -
Aceito
20 Jan 2013